sábado, 13 de dezembro de 2025

Inclusão e desporto de mãos dadas para mostrar que não há limites

Imagine rematar numa bola de futebol de olhos fechados? Pode ser difícil e, à primeira, pode nem acertar na bola, mas há jogadores que, por serem cegos ou terem baixa visão, praticam futebol de forma profissional, por exemplo no Sport Club Conimbricense. Para muitos alunos da Escola Básica Eugénio de Castro esta era uma realidade difícil de acreditar, até serem desafiados a fazê-lo durante a Semana Paralímpica que decorreu no pavilhão desportivo para dar a conhecer modalidades como andebol em cadeira de rodas, futebol para cegos, paraciclismo, boccia ou capoeira.

«O nosso objetivo era sensibilizar toda a comunidade da escola para o desporto adaptado, trouxemos vários atletas de alto nível de várias modalidades para que os alunos conhecessem o percurso deles e, no fundo, sensibilizar os alunos para a necessidade da inclusão também no desporto», explicou Diogo Ribeiro, um dos quatro professores estagiários da Faculdade de Ciências do Desporto e Educação Física da Universidade de Coimbra. Em conjunto com Tânia Domingues, Bárbara Ferreira e Pedro Oliveira e com a colaboração do professor Edgar Ventura, os professores estagiários tornaram real este desafio de levar até à escola as modalidades adaptadas. Em conversa com o Diário de Coimbra, Tânia Domingues confessou que a experiência foi «bastante gratificante». «Ver o sorriso na cara dos miúdos com as várias experiências que têm tido aqui ao longo da semana tem sido muito bom».

As atividades prolongaram-se ao longo de uma semana e envolveram centenas de alunos dos vários anos de escolaridade e o entusiasmo foi sentido por todos. «Esta semana foi incrível, porque aprendemos muito com estas pessoas que mostraram ser capazes de tudo», dizia Gustavo Antunes, aluno do 9.º ano e que participou em várias atividades. A mais difícil e mais desafiante foi «sem dúvida jogar futebol às cegas», confessou. Diogo Cancela e Matilde Gaspar, da natação adaptada; Telmo Pinão, atleta de paraciclismo, a equipa de andebol em cadeira de rodas da Associação Rovisco Pais, a equipa de boccia da Associação de Paralisia Cerebral de Coimbra estiveram presentes e mostraram que apesar das adversidades muitos atletas se tornaram verdadeiros profissionais e medalhados.

«O que trazemos até aqui é uma pequena demonstração do que podemos fazer, até porque está muito barulho no pavilhão e estes desportos requerem quase silêncio absoluto», adiantou Eunice Santos, pessoa com deficiência visual e que participou na iniciativa. «Foi muito interessante ver o entusiasmo dos alunos a experimentar as várias modalidades», acrescentou. Com cadeiras de rodas adaptadas, os próprios alunos tiveram a oportunidade de experimentar andebol adaptado e jogar ao lado dos atletas do Rovisco Pais. Com os olhos vendados alguns deles conseguiram marcar um golo na baliza e outros ainda experimentaram goalball e colocaram à prova o sentido auditivo e sensitivo.

«É com muito orgulho que recebemos, mais uma vez, a Semana Paralímpica e os vários atletas que vieram até à escola para dar o seu testemunho, a sua vivência, quais são as suas dificuldades e mostrar a tamanha superação face a todos os desafios», referiu Adosinda Rodrigues, diretora do Agrupamento de Escolas. A experiência correu tão bem, tanto para os atletas, como para os alunos, que a diretora do agrupamento espera ver a iniciativa replicada nas várias escolas, como forma de sensibilização para a inclusão de todos.

Fonte: Diário de Coimbra por indicação de Livresco

quinta-feira, 11 de dezembro de 2025

Sistema educativo falha na integração de alunos pobres e estrangeiros

O sistema educativo teve “avanços relevantes” nas últimas décadas e as taxas de conclusão/transição voltaram a valores pré-pandemia em 2023/2024 (96,1% no básico e 90,4% no secundário), mas subsistem “fragilidades nas estratégias de inclusão” que condicionam o sucesso dos alunos mais desfavorecidos e dos alunos estrangeiros. O diagnóstico é do relatório ‘Estado da Educação 2024’, do Conselho Nacional de Educação (CNE), que destaca o facto de os alunos do 3.º ciclo com escalão A da ação social escolar terem uma taxa de conclusão no tempo esperado de 71% e os estrangeiros de 73%, abaixo dos 88% dos restantes alunos.

O documento aponta a oferta “aquém do que seria necessário” da disciplina de Português Língua Não Materna (PLNM) como um dos problemas. “De 55 827 estrangeiros inscritos na educação básica, só 10 638 estiveram matriculados em PLNM (19,1%). Na educação secundária, de 14 239 alunos de nacionalidade estrangeira, 1 963 frequentaram a disciplina (13,8%), refere o relatório. Por outro lado, “apenas 48% dos estudantes mais desfavorecidos ingressam num curso superior no ano seguinte à conclusão do secundário, contrastando com 57% dos que não necessitaram de apoios financeiros”.

O relatório destaca o maior “distanciamento” face à meta de ter 55% de alunos do secundário no ensino profissional - era 39% em 2023/2024 - e pede a tomada de medidas. E aponta “desafios” quanto à “qualidade das aprendizagens” e à “adequação das qualificações” ao que a sociedade pede. Em causa estão resultados de estudos como o PIRLS, que indicam que os alunos do 4.º ano “não dominam competências básicas fundamentais para utilizarem a leitura como meio importante de aprendizagem e para compreenderem problemas complexos”. O documento lembra resultados do PISA e as dificuldades dos alunos de 15 anos para responder a questões que requerem “abstração, avaliação crítica ou formulação de hipóteses”.

O CNE pede uma maior e melhor monitorização das políticas adotadas. E sugere a “reconfiguração dos currículos e dos métodos de ensino e avaliação”, com enfoque em competências transversais”, como “a resolução de problemas, o raciocínio crítico e a criatividade”; e a promoção do bem-estar físico e socioemocional dos alunos, como integrante da aprendizagem.

Professores em falta

O presidente do CNE critica a falta de monitorização das medidas tomadas, o que torna “muito difícil tomar decisões informadas”. E aponta a necessidade de obter dados sobre o número de professores em falta; o impacto das medidas de apoio às aprendizagens; e se a atual oferta da disciplina de PLNM é ou não suficiente.

O relatório do CNE aponta “desigualdades territoriais” na “inclusão” dos alunos com necessidades especiais, devido à falta de técnicos e docentes.

“38,5% da população com idades entre os 25 e os 64 anos não possui um diploma da educação secundária”, alerta o relatório, defendendo que devido a este défice “a educação de adultos é uma questão nacional de enorme relevância”.

Fonte: CM por indicação de Livresco

quarta-feira, 10 de dezembro de 2025

Um psicólogo para 500 alunos: um wrestling português

Um psicólogo para 500 alunos nas escolas portuguesas (públicas) é como alvejar o próprio psicólogo antes de ele entrar no estabelecimento de ensino e onde irá exercer ou continuar a exercer as suas funções de orientação educacional e vocacional. Nesta luta espartana, sem intervalos humanos, como poderá um psicólogo continuar a vigiar 500 alunos? Pior, é que se viva de consciência tranquila, em sociedade, sabendo que há um psicólogo a cuidar de 500 crianças de uma vez só. Talvez se esteja a tentar vencer a Inteligência Artificial, desta forma marcial? Demonstrando que um ser humano pode gerar capacidades ‘ultra’ num ringue em que é 1 contra 500. O árbitro é o Governo (distraído, fora do ringue).

É que com a legislação de 2018 sobre as Necessidades Educativas Especiais (e não ‘Necessidades Educativas Especiais’ como muitos continuar a redigir erradamente), num universo de 500 alunos é provável que 300 tenham de estar em sessões constantes nos serviços de Psicologia, nas imediações das escolas. O que é isso de ‘necessidades’? Não se trata somente de perturbações e de doenças (algo distinto), mas também de casos de indisciplina, de bullying, etc. Ou seja, imagine-se como os números de crianças ‘em necessidades’ estão a aumentar sobretudo por causa do bullying, do ciberbullying e acresce-se a triste discriminação racial. Dos 500, talvez 499 serão da responsabilidade de um psicólogo. Este aparece como numa fábula hercúlea, em que a força é ilimitada. Mas, nem os gigabytes são ilimitados, quanto mais um sujeito humano que se formou em Psicologia e ninguém lhe disse que o Governo continua a considerar, em sede de Orçamento de Estado, que 500 alunos é um bom número anual para uma pessoa só. Mais, aplaude-se em Parlamento como uma boa investida no ‘alargamento’ da saúde comunitária focada na saúde mental dos jovens. É que antes eram mais de 700 alunos para um psicólogo e, agora, a proposta de lei decide que 500 crianças para um psicólogo já é um número razoável. O resultado mais próximo será o de alunos mais ‘doentes’ com este tipo de ‘alargamento’ do Orçamento de Estado. Incluindo o Psicólogo e o seu inimigo maior: burnout.

Quando vi a recente cartada deste Orçamento, pensei se andarão todos atentos à magnitude destes números, pois continuamos sem evoluir, nas escolas públicas, no que respeita a rácio psicólogo paciente/cliente (a criança). Mais, o Psicólogo presta apoio ao aluno e à equipa docente (apoio psicopedagógico), pelo que aumenta o universo, os 500 alunos são apenas um número, digamos, simpático e idílico. O Wrestling piora, com mau prognóstico para o Psicólogo.

Sandra Figueiredo

Fonte: Observador por partilha de Livresco

terça-feira, 9 de dezembro de 2025

Estado da Educação 2024


O Conselho Nacional de Educação publicou O Estado da Educação 2024. Deste documento, no âmbito da educação especial, destacam-se os aspetos seguintes.

No ano letivo de 2023/2024, Portugal contabilizava um total de 208 310 docentes em todos os níveis de educação e formação, segundo dados da Direção-Geral de Estatísticas de Educação e Ciência (DGEEC, 2025e). O setor público foi o principal empregador, agregando 172 258 profissionais, enquanto o setor privado contou com 36 052.

Na desagregação é visível que o 3.º CEB e a ES constituíram o maior contingente, com 77 624 docentes, o que correspondia a 46,5% do total referente à educação não superior. As restantes categorias contaram com menos profissionais: docentes de educação especial (EE) eram 8 953 e docentes/formadores de escolas profissionais (EP) 8 872. A EE constituía um setor quase exclusivo do domínio público, com 8 770 docentes, enquanto nas escolas profissionais o setor privado era dominante, empregando 7 352 docentes.

Ao nível de recursos específicos de apoio à aprendizagem e à inclusão, a lei refere a existência de recursos humanos (docentes de educação especial, técnicos especializados e assistentes operacionais, preferencialmente com formação especializada); recursos organizacionais, de entre os quais se destacam, pela sua importância ao nível da inclusão de crianças e jovens com NSE, a equipa multidisciplinar de apoio à educação inclusiva (EMAEI), o centro de apoio à aprendizagem (CAA) e o centro de recursos de tecnologias de informação e comunicação para a educação especial (CRTIC); recursos específicos existentes na comunidade, a mobilizar para apoio à aprendizagem e à inclusão, designadamente, equipas de saúde escolar (ESL), comissão de proteção de crianças e jovens (CPCJ), centro de recursos para a inclusão (CRI) e estabelecimentos de educação especial com acordo de cooperação com o Ministério da Educação, Ciência e Inovação (MECI).

Os recursos legais existentes são, indubitavelmente, de máxima importância, mas são as pessoas nos seus contextos que, colaborativamente, fazem a diferença e criam ambientes educativos mais inclusivos, garantem oportunidades reais para que todos sejam autónomos, tanto quanto possível, no desenvolvimento de aprendizagens e competências, através de vivências favoráveis à sua integração e socialização. Porém, num contexto de escassez de docentes, incluindo de educação especial, decorrente da crescente dificuldade em recrutar e reter profissionais qualificados (OCDE, 2022), e de insuficiência de técnicos especializados em algumas escolas, bem como do número reduzido de assistentes operacionais com formação especializada, sucede, por vezes, que estes profissionais assumem funções para as quais não estão capacitados nem detêm o conhecimento necessário para lidar com situações de grande complexidade.

A questão dos recursos é recorrentemente apontada pela sua insuficiência, porém, há outras fragilidades que ultrapassam o lado quantitativo, designadamente a gestão e capacitação dos recursos ao nível da adequação das respostas à diversidade dos alunos e à promoção de práticas inclusivas em sala de aula (IGEC, 2024). Organizações sindicais de professores também têm alertado para a falta de técnicos especializados, a par de docentes de educação especial e assistentes operacionais (FNE; 2024; FENPROF, 2025).

Entre o 3.º ciclo da educação básica (CEB) e a educação secundária, registou-se uma diminuição no número de alunos para os quais foram mobilizadas medidas seletivas e/ou adicionais. Em 2023/2024, foram aplicadas “apenas medidas seletivas” a 11 080 alunos da educação secundária, o que representava 50,5% dos alunos que tinham a mesma tipologia de medida no 3.º CEB, no ano anterior (DGEEC, 2025). Este decréscimo é igualmente visível para os alunos com “apenas medidas adicionais” (617, representando 68,3%) e para os que tinham “medidas seletivas e adicionais” (2 451, representando 52,6%).

O que sucedeu aos alunos que parecem ter desaparecido? Terão atingido a maioridade e saído do sistema educativo? Terão sido encaminhados para estabelecimentos de educação especial, com acordo de cooperação com o MECI? Terão estes a capacidade de resposta para as necessidades existentes? Quantas crianças e jovens os frequentam? Entre o ideal e o quotidiano da inclusão dos alunos com NSE subsistem algumas zonas de sombra. Importa monitorizar os percursos destes alunos, incluindo os mais vulneráveis do sistema. Muitas famílias enfrentam ausência de respostas adequadas quando os jovens com limitações severas terminam a escolaridade obrigatória, ficando num vazio institucional.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2025

Escolas pedem mudanças urgentes após onda de indisciplina: pais e professores falam em “perceção de insegurança”

Casos recentes de agressões entre alunos, ameaças a professores e situações de risco dentro das escolas estão a aumentar a perceção de insegurança entre pais e docentes. De acordo com o Público, o problema ganhou nova dimensão após episódios registados no 1.º período, incluindo crianças feridas, turmas incapazes de manter a ordem e frequente intervenção policial.

Na Escola Ruy Belo, em Sintra, encarregados de educação descrevem alunos aterrorizados e professores sem capacidade para controlar comportamentos cada vez mais disruptivos. A associação de pais admite dificuldades na aplicação de medidas disciplinares, sobretudo quando os responsáveis dos alunos infratores não colaboram ou adotam posturas agressivas.

A Federação Nacional da Educação e exige medidas imediatas e reforço de meios e fala em escolas onde a indisciplina “saiu de controlo”.

Apesar disso, os dados do último ano letivo mostram uma redução das ocorrências registadas por PSP e GNR.

Ainda assim, diretores escolares defendem que o Estatuto do Aluno está desatualizado e demasiado burocrático, e pedem mais psicólogos, maior envolvimento dos pais e reforço das CPCJ.

Fonte: CNN Portugal por indicação de Livresco

sexta-feira, 5 de dezembro de 2025

“Os jovens não podem continuar a enfrentar o sofrimento emocional sozinhos”

Em entrevista exclusiva ao Healthnews, Mariana Rodrigues, investigadora do CIIE, comenta os alarmantes dados do estudo CARING: 1 em cada 8 jovens já pensou que "a vida não vale a pena". A especialista defende um plano nacional urgente e aponta a interseção entre mal-estar psicológico e mundo digital como o risco mais negligenciado

HealthNews (HN) – O estudo CARING revela que 1 em cada 8 jovens portugueses já experienciou pensamentos de que “a vida não vale a pena ser vivida”. Perante esta prevalência, qual é a mensagem mais urgente que gostaria de transmitir a pais, educadores e decisores políticos?

Mariana Rodrigues (MR) – Isto constitui uma evidência da elevada prevalência da ideação suicida entre adolescentes e jovens em Portugal, tal como documentado pelo estudo CARING. Esta prevalência revela que não estamos perante casos isolados, mas sim diante de um fenómeno silencioso, presente na vida de muitos adolescentes e jovens. Perante estes dados, é urgente transmitir a pais, educadores e decisores políticos que, por um lado, é essencial normalizar a conversa sobre sofrimento emocional e pensamentos suicidas com jovens. A investigação é clara ao demonstrar que perguntar diretamente sobre ideação suicida não aumenta o risco, mas antes cria oportunidades para identificação precoce e acesso a apoio adequado. Falar abertamente diminui o estigma, promove segurança emocional e valida experiências que muitos jovens vivem em silêncio. Por outro lado, torna-se imperativo reconhecer que a prevenção do suicídio juvenil não é apenas responsabilidade dos serviços de saúde mental, mas sim uma tarefa coletiva que exige respostas estruturais e concertadas. A literatura internacional e o próprio relatório CARING mostram que a ideação suicida resulta de uma combinação de fatores psicológicos, relacionais, escolares e digitais. Assim, a prevenção deve envolver: as famílias, que necessitam de apoio para desenvolver competências de comunicação e reconhecimento de sinais de alerta; as escolas, que devem ser capacitadas para implementar programas de promoção do bem-estar e intervenção precoce; as plataformas digitais, cujo papel na exposição a conteúdos nocivos e na amplificação do sofrimento psicológico exige maior responsabilização; os decisores políticos, que devem garantir recursos humanos, políticas públicas e estratégias nacionais coordenadas. A mensagem central é simples e urgente: os jovens não podem continuar a enfrentar o sofrimento emocional sozinhos. Precisamos de criar sistemas de cuidado, proximidade e proteção que respondam às suas necessidades reais e ao contexto digital em que vivem.

HN – Os resultados apontam para três fatores de risco principais: mal-estar psicológico, exposição a conteúdos online prejudiciais e cyberbullying. Na sua perspetiva, qual destes fatores representa o vetor de risco mais desafiante ou negligenciado atualmente?

MR – Os resultados do CARING mostram que o sofrimento emocional geral, a exposição a conteúdos online relacionados com suicídio e automutilação, e as experiências de cyberbullying são os fatores que evidenciam uma associação mais significativa com a ideação suicida na juventude. Na minha perspetiva, o fator de risco mais desafiante e mais frequentemente negligenciado é precisamente a interseção entre mal-estar psicológico e exposição a conteúdos online potencialmente prejudiciais. Vivemos num contexto em que grande parte do lazer juvenil decorre no espaço digital, sobretudo em redes sociais, o que significa que muitos jovens em sofrimento emocional procuram na Internet explicações, validação ou formas de lidar com a sua dor. Quando o fazem, encontram frequentemente conteúdos que normalizam a automutilação, romantizam o sofrimento ou apresentam estratégias nocivas, amplificando estados mentais já fragilizados. A literatura científica tem sido consistente ao documentar ligações entre a utilização intensiva de plataformas digitais, a exposição a experiências e conteúdos nocivos online e indicadores mais baixos de saúde mental, incluindo depressão, ansiedade e ideação suicida. Esta vulnerabilidade é intensificada pelo próprio processo de desenvolvimento biológico, psicológico e social da adolescência, que torna a população juvenil mais suscetível à influência externa, à validação social e à pressão dos pares. Trata-se, portanto, de um risco frequentemente subestimado porque ocorre em ambientes digitais opacos aos adultos, de difícil monitorização e onde a lógica algorítmica e comercial das plataformas nem sempre se alinha com a proteção de menores. Quando os modelos de negócio privilegiam o envolvimento acima da segurança, os jovens em situação de vulnerabilidade emocional podem ser facilmente conduzidos a cadeias de conteúdos que reforçam e aprofundam o seu mal-estar psicológico e social.

HN – O estudo identifica que jovens mais velhos, do sexo feminino e com estatuto socioeconómico mais baixo apresentam níveis mais elevados de ideação suicida. Que medidas específicas e direcionadas recomenda para apoiar estes grupos em particular?

MR – O CARING mostra que jovens mais velhos, do sexo feminino e com estatuto socioeconómico mais baixo estão associados a níveis mais elevados de ideação suicida. Para estes grupos, podem ser implementados programas de prevenção do suicídio e de promoção de competências socioemocionais, articulados com equipas de psicologia escolar e com acompanhamento e encaminhamento contínuo. A evidência mostra que programas escolares bem desenhados podem reduzir comportamentos suicidários e aumentar a capacidade de intervenção de professores e assistentes técnicos. Para raparigas, importa integrar abordagens específicas de género que trabalhem autoimagem, violência de género (incluindo online) e expectativas sociais, bem como a relação entre redes sociais, comparação social e autoestima. Para jovens provenientes de contextos socioeconómicos mais desfavorecidos, é fundamental garantir acesso a apoio psicológico gratuito, reforçar equipas multidisciplinares nas escolas situadas em territórios vulneráveis e articular serviços de saúde, educação e proteção social. A investigação demonstra que as desigualdades socioeconómicas estão associadas a níveis mais elevados de ideação suicida e de sofrimento emocional na adolescência.

HN – Do lado protetor, o CARING destaca a importância de fatores como a autoestima, a atividade física e o sono. Como é que as comunidades escolar e familiar podem promover ativamente estes recursos individuais no dia a dia dos jovens?

MR – O projeto CARING mostra que autoestima elevada, prática regular de atividade física, sono de qualidade e atividades ao ar livre estão associados a menor ideação suicida. Estudos longitudinais reforçam que uma autoimagem positiva, a prática de exercício e uma boa ligação à escola são fatores protetores robustos contra ideação e tentativas de suicídio. Por sua vez, dormir recorrentemente mal e pouco é um preditor do aumento da ideação suicida. Na prática, isto implica que, nas escolas, existam horários e cargas de trabalho que não comprometam o tempo de sono, uma oferta regular de atividade física atrativa, incluindo modalidades não competitivas para além das da disciplina de Educação Física, e o desenvolvimento de projetos inclusivos e colaborativos de promoção de competências de autoestima, pertença e empatia. Na família, implica estabelecer rotinas de sono regulares, sem dispositivos digitais no quarto à noite, incentivar atividades ao ar livre e desportivas, valorizar as pequenas conquistas do dia a dia e promover um clima comunicacional em que os jovens se sintam vistos e escutados.

HN – O papel da família e dos amigos como “âncoras psicológicas” é fundamental. De que forma é que o ambiente digital, frequentemente acusado de afastar as pessoas, pode ser também uma ferramenta para fortalecer estas relações de apoio e de qualidade?

MR – O ambiente digital é frequentemente acusado de contribuir para o isolamento social, mas pode também ser usado como uma extensão das relações de apoio, ao possibilitar canais de comunicação que colmatam distâncias e asseguram a manutenção da qualidade dos laços mais importantes, especialmente em contextos de migração, famílias separadas ou estilos de vida que dificultam o contacto presencial. O ambiente digital amplia ainda o acesso a redes de suporte formais e informais, onde uma pessoa pode encontrar validação e apoio de pares que enfrentam problemas comuns, como luto, ansiedade ou condições de saúde, para além do seu círculo imediato. Possibilita também a criação de meios digitais que facilitam pedidos de ajuda, anónimos ou não, a psicólogos, profissionais de saúde e serviços de apoio.

HN – Uma das recomendações do estudo é um maior controlo e responsabilização das plataformas digitais. Que tipo de regulamentação ou cooperação com as empresas de tecnologia considera mais viável e eficaz para criar ambientes online mais seguros em Portugal?

MR – O CARING sublinha a necessidade de maior controlo, responsabilização e regulação das plataformas digitais. A nível europeu, o Digital Services Act (DSA) já estabelece obrigações acrescidas para plataformas de grande dimensão na proteção de menores, incluindo avaliação de riscos sistémicos, mitigação de conteúdos prejudiciais e desenho mais seguro de serviços. Países como o Reino Unido aprovaram legislação que obriga à remoção rápida de conteúdos de suicídio e automutilação, responsabilizando empresas em caso de incumprimento; e a Dinamarca avançou para a proibição de acesso às redes sociais a menores de 15 anos. Em Portugal, considero urgente reforçar a implementação nacional do DSA com foco específico na proteção de menores, incluindo auditorias regulares às plataformas mais usadas por jovens. É igualmente essencial exigir mecanismos eficazes de verificação da idade, a limitação de funcionalidades aditivas (scroll infinito, autoplay) para menores e sistemas de reporte de conteúdos de autoagressão rápidos e transparentes. Importa também estimular acordos de cooperação entre escolas, serviços de saúde e plataformas para a remoção efetiva de conteúdos online potencialmente prejudiciais — desde violência e discurso de ódio a incentivos ao suicídio e outros comportamentos de risco — bem como para o desenvolvimento de ferramentas de sinalização e encaminhamento para linhas de ajuda.

HN – Considerando os dados alarmantes, qual considera ser o primeiro e mais importante passo a dar, de forma concertada, para transformar estas evidências científicas em ações concretas de prevenção do suicídio juvenil em Portugal?

MR – Atendendo aos dados recolhidos junto de uma amostra representativa de jovens, podemos assumir que existe um problema grave que exige ação concertada. Diria que o primeiro passo passa pela definição e implementação de um plano nacional integrado de prevenção do suicídio juvenil, que una saúde, educação e proteção social, articulando o que hoje existe de forma fragmentada. Este plano deve incluir o reforço imediato de recursos humanos em saúde mental nas escolas, garantindo psicólogos em número suficiente e equipas multidisciplinares capazes de identificar precocemente sinais de sofrimento emocional e responder de forma continuada. É igualmente necessário capacitar pais, professores e outros profissionais para desenvolver competências que lhes permitam reconhecer sinais de risco, falar sobre suicídio de forma segura e encaminhar para ajuda especializada. É urgente reforçar a educação digital no currículo, promovendo junto de crianças e jovens o conhecimento, as competências e as atitudes necessárias para lidar com os desafios trazidos pelas tecnologias digitais e participar plenamente numa sociedade diversa e altamente mediatizada. Por fim — e essencial, atendendo à centralidade que as tecnologias ocupam no quotidiano juvenil — é urgente garantir maior controlo, responsabilização e regulação das plataformas digitais, assegurando ambientes online mais seguros, transparentes e adequados ao desenvolvimento de crianças e jovens.

Fonte: Sapo por indicação de Livresco

Esposende implementa Projeto Patinhas 21 junto de 80 alunos com Necessidades Educativas Específicas

O Município de Esposende iniciou a implementação do Projeto Patinhas 21, uma intervenção inovadora que recorre a cães como coterapeutas no desenvolvimento de crianças e jovens com Necessidades Educativas Específicas. Esta ação decorre no âmbito do Plano de Ação Intermunicipal para a Inclusão Ativa de Grupos Vulneráveis e resulta de uma parceria com os Agrupamentos de Escolas António Correia de Oliveira e António Rodrigues Sampaio e com a Escola Secundária Henrique Medina.

Dinamizado pela Associação Amar 21, o projeto envolve doze grupos, num total de oitenta alunos, que participam em sessões regulares com cães de intervenção. Estas sessões proporcionam uma experiência única, promovendo o desenvolvimento psicomotor, emocional e social dos participantes.

A intervenção é assegurada por uma equipa multidisciplinar composta por terapeutas da fala, psicomotricistas, terapeutas ocupacionais, educadores de ensino especial, fisioterapeutas, psicólogos e cinoterapeutas. Esta equipa articula-se para maximizar os benefícios terapêuticos da relação entre as crianças e os cães.

Todas as atividades decorrem em contexto escolar, garantindo a plena integração dos alunos e a eliminação de barreiras associadas a deslocações. O projeto alia ciência, afeto e inclusão para trabalhar áreas como a coordenação motora, equilíbrio, motricidade fina, regulação emocional e comportamental, além do reforço das competências sociais e comunicacionais.

As sessões são realizadas semanalmente, com a presença dos técnicos especializados e dos cães, sendo complementadas por avaliações periódicas e relatórios multidisciplinares que permitem monitorizar a evolução de cada grupo.

O Projeto Patinhas 21 integra ainda workshops e ações de sensibilização dirigidos à comunidade escolar, reforçando a importância da inclusão e da cooperação entre todos os agentes educativos.

Até ao momento, o projeto tem sido amplamente valorizado pelos estabelecimentos de ensino onde está a ser desenvolvido, que destacam os efeitos positivos no bem-estar e progresso dos alunos envolvidos.

Esposende implementa Projeto Patinhas 21 junto de 80 alunos com Necessidades Educativas Específicas

O Município de Esposende iniciou a implementação do Projeto Patinhas 21, uma intervenção inovadora que recorre a cães como coterapeutas no desenvolvimento de crianças e jovens com Necessidades Educativas Específicas. Esta ação decorre no âmbito do Plano de Ação Intermunicipal para a Inclusão Ativa de Grupos Vulneráveis e resulta de uma parceria com os Agrupamentos de Escolas António Correia de Oliveira e António Rodrigues Sampaio e com a Escola Secundária Henrique Medina.

Dinamizado pela Associação Amar 21, o projeto envolve doze grupos, num total de oitenta alunos, que participam em sessões regulares com cães de intervenção. Estas sessões proporcionam uma experiência única, promovendo o desenvolvimento psicomotor, emocional e social dos participantes.

A intervenção é assegurada por uma equipa multidisciplinar composta por terapeutas da fala, psicomotricistas, terapeutas ocupacionais, educadores de ensino especial, fisioterapeutas, psicólogos e cinoterapeutas. Esta equipa articula-se para maximizar os benefícios terapêuticos da relação entre as crianças e os cães.

Todas as atividades decorrem em contexto escolar, garantindo a plena integração dos alunos e a eliminação de barreiras associadas a deslocações. O projeto alia ciência, afeto e inclusão para trabalhar áreas como a coordenação motora, equilíbrio, motricidade fina, regulação emocional e comportamental, além do reforço das competências sociais e comunicacionais.

As sessões são realizadas semanalmente, com a presença dos técnicos especializados e dos cães, sendo complementadas por avaliações periódicas e relatórios multidisciplinares que permitem monitorizar a evolução de cada grupo.

O Projeto Patinhas 21 integra ainda workshops e ações de sensibilização dirigidos à comunidade escolar, reforçando a importância da inclusão e da cooperação entre todos os agentes educativos.

Até ao momento, o projeto tem sido amplamente valorizado pelos estabelecimentos de ensino onde está a ser desenvolvido, que destacam os efeitos positivos no bem-estar e progresso dos alunos envolvidos.

Fonte: Município de Esposende por indicação de Livresco

quinta-feira, 4 de dezembro de 2025

Falta de professores de educação especial duplica número de alunos sem apoio direto nas escolas portuguesas

O número de alunos com necessidades educativas, mas sem acesso direto a um professor de educação especial duplicou, segundo um levantamento nacional que revela que estes docentes têm de dar orientações a outros sobre como trabalhar com as crianças.

A Federação Nacional dos Professores (Fenprof) voltou a realizar este ano um inquérito aos diretores sobre as condições em que funciona a educação especial nas escolas e os resultados esta quarta-feira divulgados mostram que o apoio dado aos alunos piorou por falta de profissionais.

Cerca de oito em cada dez diretores inquiridos dizem ter falta de professores de educação especial, de técnicos especializados e de assistentes operacionais, mas também dizem que há cada vez mais alunos a precisar de apoio.

Num universo de 15.437 alunos, a grande maioria tem apoio direto, mas 9,1% recebem apenas "apoio indireto", segundo o inquérito, ao qual responderam 147 diretores de escolas e agrupamentos.

A falta de professores de educação especial leva a que estes docentes tenham de dar orientação aos titulares de turma sobre como trabalhar com estes alunos.

"Há mais alunos nas escolas, há mais alunos com necessidades específicas, mas não há recursos humanos para trabalhar com estes alunos e por isso ficam com o apoio indireto. Muitas vezes estes professores, terapeutas ou psicólogos nem conhecem os alunos", salientou Ana Simões, coordenadora nacional da educação especial da Fenprof, durante a apresentação dos resultados do levantamento.

Comparando com os resultados do inquérito realizado no ano passado, há agora mais alunos apenas com "apoio indireto": Em 2024, eram 4,4% e agora representam 9,1%.

Os diretores explicam este aumento com o facto de haver mais alunos a necessitar de apoio específico e de existirem menos professores disponíveis.

"Os diretores continuam a afirmar que não têm os recursos necessários para assegurar uma educação inclusiva na escola. Não há inclusão nas escolas", denunciou Ana Simões.

No levantamento realizado este ano, 74,3% das escolas e agrupamentos apontou a falta de docentes da Educação Especial, enquanto no ano passado este era um problema sentido por 64% dos diretores.

Também na maioria das escolas, os diretores reportaram falta de técnicos especializados e de assistentes operacionais.

O problema é também denunciado pela Associação Portuguesa de Deficientes. A vice-presidente Helena Rato criticou esta quarta-feira a falta de recursos, lembrando que o abandono escolar tem vindo a aumentar e que as famílias mais carenciadas são sempre as mais afetadas.

Quando as escolas púbicas não conseguem dar resposta às famílias com crianças com necessidades educativas especiais, "o Governo recorre ao subsídio de educação especial, mas o valor desse subsídio é francamente insuficiente", criticou Helena Rato, explicando que os apoios rondam os 300 euros.

Resultado: "Os pais que têm dinheiro para colmatar o que falta conseguem pôr os filhos no ensino privado, os outros, paciência, ficam em casa", disse durante a conferência de imprensa realizada hoje em Lisboa.

No Dia Internacional das Pessoas com Deficiência, Helena Rato fez questão de lembrar também o problema que estes jovens enfrentam quando terminam a escolaridade obrigatória: "A situação é tão grave, tão grave que em Barcelos um pai de um aluno nestas circunstâncias foi fazer greve de fome porque não há apoio nenhum para estas pessoas".

segunda-feira, 1 de dezembro de 2025

"Por Ti – O Poder de Quem Ama Sozinho"

Hoje, divulgo o livro ""Por Ti – O Poder de Quem Ama Sozinho". O autor, André A.F. Ferro, tem paralisia cerebral, o que lhe causa significativas dificuldades motoras, necessitando de cadeira de rodas para se deslocar. Apesar destes desafios, formou-se em Direito e exerce atualmente a profissão de advogado.


O livro está disponível para compra nas seguintes livrarias:


A apresentação do livro será no dia 6 de dezembro de 2025, pelas 14h00, no SOHO CLUB.

quinta-feira, 27 de novembro de 2025

Os desafios de famílias de jovens com deficiência: "Na prática nada acontece, só vemos portas fechadas"

A falta de apoios a cidadãos com deficiência continua a ser uma dos maiores razões de queixa. As dificuldades são sentidas, por exemplo, pelas famílias com filhos com necessidades educativas especiais. Marlene, mãe de Sara, uma menina que tem trissomia 21 e autismo severo, reclama das "portas fechadas" e pede que a filha seja vista e respeita "como qualquer outra criança".

A rotina de Marlene é a mesma há três anos. A filha mais nova, Sara, tem trissomia 21 e autismo severo. Depende da mãe para praticamente tudo. Sara nasceu há 16 anos em Gondomar e é lá que vive com a irmã e a mãe, a única cuidadora.

Sem pai presente e sem retaguarda familiar, Marlene esteve em casa para cuidar da filha. Mas em 2022, quis retomar a vida profissional. Conseguiu um emprego em Castelo de Paiva e trouxe Sara para uma escola mais perto.

Conciliar tudo é "muito difícil". Nas tardes sem aulas e sobretudo nas férias, a dificuldade aumenta.

Marlene teme ter de deixar o emprego

Nos últimos anos, tentou inscrever a filha em campos de férias e programas sociais, mas nunca conseguiu. Diz que só após uma queixa à Provedoria da Justiça, foi ouvida pela Câmara de Gondomar.

“Propuseram-me uma técnica da Segurança Social, algo que eu já tinha tido no passado. Não vai resolver o problema central da Sara, que é encaminhá-la para um local justo, digno e inclusivo, para ter os mesmos direitos de qualquer outra criança”, frisa Marlene.

Em Castelo de Paiva, a falta de resposta mantém-se, agravada pelo facto de este não ser o concelho de residência. Quando, daqui a dois anos, Sara atingir a maioridade, a incerteza será ainda maior e Marlene teme ter de deixar o trabalho.

A única esperança passa por uma nova resposta especializada, prevista para o concelho, mas sem data nem garantia de vaga.

Este é um dos muitos casos que expõe um país ainda pouco preparado para as crianças e jovens com necessidades educativas especiais. À procura de ajuda, Marlene faz sua a voz de muitos pais.

quarta-feira, 26 de novembro de 2025

A Educação Inclusiva e o Orçamento do Estado 2026

O Ministério da Educação, Ciência e Inovação lançou o documento "Orçamento do Estado 2026: Nota Explicativa". Nesse documento, constam referências à Educação Inclusiva. Nesta área destaca-se o seguinte:

5.2. Rever o enquadramento legislativo da Educação Inclusiva e assegurar respostas diversificadas e ajustadas às necessidades dos alunos

O Decreto-Lei (54/2018, de 6 de julho) que estabelece o regime jurídico da educação inclusiva em Portugal considera a inclusão como princípio estruturante de toda a escola e não apenas como uma vertente ligada à educação especial. Contudo, a sua concretização nas escolas coloca muitos desafios , sendo frequentemente identificadas pelas equipas no terreno diversas áreas suscetíveis de melhoria. 

Entre as principais dificuldades destacam-se inconsistências conceptuais, falta de formação dos profissionais, falta de clareza nas responsabilidades e morosidade dos processos. 

Atendendo à natureza complexa dos desafios associados à inclusão, o diploma será revisto com vista a promover uma abordagem integrada e multissetorial, que assegure uma operacionalização mais clara e eficaz. Esta revisão envolverá as áreas da Educação, Saúde e Segurança Social, garantindo uma resposta articulada e coerente. 

Pretende -se reorganizar os processos e criar um sistema de intervenção mais eficiente, através da revisão dos critérios de atribuição de recursos materiais e humanos e do reforço da formação dos profissionais, com base em enquadramentos jurídicos claros e consistentes. 

Em 2026, está previsto no âmbito da educação inclusiva um orçamento de 39 0 milhões de euros para recursos, apoios e medidas que promovam a inclusão efetiva de todos os alunos . 

terça-feira, 25 de novembro de 2025

O que uma nova definição de dislexia pode significar para as escolas

Uma recente alteração na definição de dislexia proposta por um grupo internacional de investigadores e profissionais pode influenciar as decisões políticas que determinam quais crianças são identificadas como portadoras dessa dificuldade de leitura.

A dislexia, uma condição neurobiológica que afeta a forma como os indivíduos leem e soletram, ganhou destaque nas escolas de ensino básico e secundário na última década. Em grande parte, como resultado da crescente defesa dos pais, 34 estados exigem agora que as escolas examinem as crianças para detetar dislexia no início do ensino básico.

Agora, a influente Associação Internacional de Dislexia revisou a definição da dificuldade de leitura de uma forma que pode afetar a forma como alguns estados operam o seu processo de triagem — eliminando da definição de 2002 a referência à dislexia como «frequentemente inesperada em relação a outras capacidades cognitivas».

A dislexia não está relacionada à inteligência, e as crianças que têm essa condição ainda podem — e muitas vezes conseguem — ter sucesso académico. Quando os investigadores começaram a estudar essa deficiência nas décadas de 1960 e 1970, identificaram os alunos como disléxicos quando suas habilidades de leitura deficientes não podiam ser explicadas pela sua inteligência geral, medida por testes de QI.

Isso deu origem a um método de diagnóstico da dislexia que ainda hoje é popular, chamado modelo da discrepância, através do qual as crianças são identificadas como disléxicas se houver uma diferença inesperada entre as suas capacidades intelectuais e o seu desempenho na leitura.

Mas um conjunto crescente de evidências mostra que esse modelo pode estar deixando muitos alunos disléxicos sem diagnóstico, disse Charles Haynes, professor emérito do MGH Institute of Health Professions, uma universidade em Boston focada em ciências da saúde, e copresidente do comitê diretor para a nova definição.

Texto em inglês, com acesso restrito, disponível em Education Week por indicação de Livresco

segunda-feira, 24 de novembro de 2025

Ministro da Educação diz que desvalorizar ensino profissional foi um erro

O ministro da Educação, Ciência e Inovação, Fernando Alexandre, defendeu esta sexta-feira a importância dos centros tecnológicos especializados e disse que a desvalorização do ensino profissional durante muitos anos "foi um erro".

"Durante muitos anos, de facto, desvalorizou-se o ensino profissional. Foi um erro que cometemos, que felizmente já foi invertido há uns anos, porque aquilo que precisamos é ter percursos alternativos para os estudantes, adequados ao perfil dos estudantes e que garanta também a empregabilidade", declarou.

De acordo com Fernando Alexandre, "o ensino profissional, com os equipamentos que hoje estão cada vez mais disponíveis nas escolas portuguesas, permite a obtenção de competências que vão ser muito importantes para o mercado de trabalho".

Este é um percurso "que não fecha outras portas", já que "seguir a via profissional dá acesso na mesma ao ensino superior", sustentou o ministro.

O titular da pasta da Educação asseverou a necessidade "de um ensino mais diversificado e ajustado ao perfil dos estudantes", que pode ser respondida através do ensino profissional, uma solução também para as demandas empresariais.

O ministro da Educação, Ciência e Inovação falava na manhã desta sexta-feira com os jornalistas, à margem da inauguração do Centro Tecnológico Especializado (CTE) Industrial da Escola Secundária de Avelar Brotero, em Coimbra, que contou com um investimento de mais de 1,4 milhões de euros do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).

Na mesma escola, está também prevista a criação do CTE de informática, financiado em cerca de um milhão de euros pela mesma fonte, cuja inauguração se estima para março de 2026.

Como relembrou Fernando Alexandre, em todo o território nacional continental foram aprovados 404 CTE, com a estimativa de concluir a totalidade dos projetos até junho de 2026, dentro do prazo do PRR, que financia a medida com 480 milhões de euros.

Até o momento, cerca de uma centena de CTE estão prontos, mas Fernando Alexandre garantiu que agora o processo será rápido, com alguns dos espaços já em fase de conclusão.

"Isto vai ser uma grande transformação da qualidade do ensino profissional, porque os estudantes passam a ter acesso a equipamentos modernos. Aliás, muitas vezes até mais atualizados do que os que vão encontrar em algumas empresas", frisou.

Atualmente, acrescentou o ministro, "cerca de 40% dos estudantes do secundário já estão na via profissional", sendo que o objetivo é atingir cerca de 50% dos alunos.

"Obviamente, as escolas têm que se ir adaptando à procura, fazer esse ajustamento", realçou.

Questionado sobre as críticas que a medida tem recebido, pela possibilidade de condicionar o acesso dos jovens ao ensino superior, o governante respondeu que esta "não é uma visão certa", porque foi através dela que o Governo conseguiu "reduzir muito o abandono escolar em Portugal".

Entre as razões para a diminuição do abandono escolar, está a possibilidade de alunos do ensino científico-humanístico, que poderiam "não ter um percurso de tanto sucesso e não terem a motivação", encontrarem no ensino profissional "a motivação e as condições" para concluir o secundário.

"Neste momento, os dados indicam que mais de 20% dos alunos que terminam a via profissional ingressam no ensino superior diretamente", reforçou.

"A passagem por um mercado de trabalho deve abrir a possibilidade de sempre, ou nunca fechar a porta, do ingresso no ensino superior. Aliás, esse é um dos desafios que o ensino superior tem: conseguir alargar a sua população estudantil, a partir não apenas de estudantes com 18 anos", reiterou.

A cerimónia de inauguração do CTE Industrial da Escola Secundária de Avelar Brotero contou com a presença da presidente da Câmara de Coimbra, Ana Abrunhosa, que reiterou ao ministro o compromisso do município com a educação e a valorização dos profissionais que trabalham em escolas.

Fonte: RR por indicação de Livresco

sexta-feira, 21 de novembro de 2025

Crianças que contam pelos dedos desenvolvem competências matemáticas mais avançadas

As crianças que contam pelos dedos entre os 4 e os 6,5 anos de idade apresentam um melhor desempenho em soma matemática aos 7 anos do que as que não utilizam os dedos, segundo um estudo.

A conclusão sugere que contar pelos dedos é um passo importante para o desenvolvimento de competências matemáticas mais avançadas, de acordo com uma investigação da Universidade de Lausanne, na Suíça, publicada pela Associação Americana de Psicologia na revista "Developmental Psychology".

"Contar pelos dedos não é apenas uma ferramenta para o sucesso imediato em crianças pequenas, mas também uma forma de apoiar o desenvolvimento de competências aritméticas abstratas avançadas", reflete a autora principal, Catherine Thevenot, da Universidade de Lausanne, citada na quinta-feira pela agência Europa Press.

Contar pelos dedos é muito utilizado pelas crianças pequenas como estratégia para resolver problemas matemáticos.

No entanto, muitos professores do ensino primário esperam que as crianças deixem de contar pelos dedos demasiado cedo.

Um estudo francês apurou que 30% dos professores do primeiro ano consideram a contagem pelos dedos um sinal de que a criança está com dificuldades em compreender conceitos numéricos.

Investigações anteriores avaliavam geralmente as crianças num único momento e constatavam que aquelas que utilizavam os dedos para contar tinham um melhor desempenho em aritmética do que as que não os utilizavam, até aproximadamente aos 7 anos de idade.

No entanto, após os 7 anos, a relação inverte-se, e as crianças que não usavam os dedos passam a ter um melhor desempenho do que as que os usavam.

O que permanecia incerto, porém, era se as crianças que não usavam os dedos aos 7 anos nunca os tinham usado ou se eram "ex-utilizadores dos dedos" que tinham abandonado a prática.

"O nosso estudo teve como objetivo clarificar esta distinção e compreender melhor o que o uso dos dedos, ou a sua ausência, revela sobre o desenvolvimento aritmético das crianças", explicou Thevenot.

Estudo envolveu 211 crianças desde o pré-escolar até ao 2.º ano do ensino básico

Para tal, Thevenot e a sua colega, Marie Krenger, acompanharam 211 crianças suíças entre os 4,5 e os 7,5 anos (desde o pré-escolar até ao segundo ano do ensino básico) para avaliar como as suas estratégias de contagem com os dedos mudaram ao longo do tempo e a sua relação com a capacidade matemática.

Duas vezes por ano, os investigadores pediam às crianças que resolvessem até três conjuntos de problemas de adição com dificuldade crescente: somar dois dígitos entre 1 e 5, somar um dígito entre 1 e 5 a outro entre 6 e 9 e somar dois dígitos entre 6 e 9.

Em cada teste, os investigadores só avançavam para o nível de dificuldade seguinte se a criança tivesse resolvido corretamente 80% do conjunto anterior.

Os investigadores filmaram as crianças e observaram se usavam os dedos durante as tarefas de adição.

De um modo geral, verificaram que a contagem com os dedos atingia o pico por volta dos 5,5 aos 6 anos de idade. Até aos 5 anos, mais crianças conseguiam somar sem usar os dedos do que com eles.

No entanto, aos 6,5 anos, 92% das crianças já tinham utilizado os dedos em pelo menos um dos itens do teste.

Aos 7,5 anos, 43% das crianças eram "ex-contadoras com os dedos" (tinham usado os dedos para pelo menos um item do teste, mas já não o faziam), enquanto 50% eram contadoras com os dedos atualmente e apenas 7% nunca tinham usado os dedos.

De um modo geral, os investigadores descobriram que as crianças com melhor desempenho eram aquelas que tinham usado os dedos no passado, mas já não dependiam deles.

A partir dos seis anos de idade, estas ex-utilizadoras dos dedos superaram tanto as crianças que nunca usaram os dedos como as que ainda os usavam.

"Isto tem implicações importantes, pois demonstra que não há razão para desencorajar as crianças na escola de usar os dedos para resolver problemas aritméticos", defendeu Thevenot.

Um quarto dos alunos com pais estrangeiros reprova ou desiste no secundário

Alunos de origem imigrante chegam a chumbar três vezes mais do que os colegas de origem nacional. Diferenças podem estar relacionadas com integração e frequência de Português Língua Não Materna.

As desigualdades na progressão escolar entre os alunos filhos de pais estrangeiros face àqueles cujos pais têm nacionalidade portuguesa continuaram sem recuar no ano lectivo de 2023/ 2024. No secundário, as taxas de retenção e desistência ascenderam a 25,5%, entre os alunos cujos dois pais tinham nacionalidade estrangeira (ou um dos pais e o próprio aluno). É uma diferença de 17,3 pontos percentuais face à taxa verificada nos alunos com ambos os progenitores portugueses (8,2%).

Um quarto dos alunos com pais estrangeiros reprova ou desiste no secundário
Na prática, os alunos com pais estrangeiros chumbam três vezes mais do que os colegas de origem portuguesa, como apontam os dados que constam do Perfil Escolar de Alunos Filhos de Pais com Nacionalidade Estrangeira 2023/ 2024, publicado há dias pela Direcção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência (DGEEC). (...)

Fonte: Público por indicação de Livresco

quinta-feira, 20 de novembro de 2025

Pais de filhos com deficiência ou doença crónica terão subsídio de 80%

A proposta de alteração ao Orçamento do Estado para 2026 (OE2026) ainda não foi votada na Assembleia da República, mas já se sabe que será aprovada: o subsídio para os pais com licença para assistência a filho com deficiência ou doença crónica será aumentado dos actuais 65% para 80% da remuneração de referência. O limite máximo para o subsídio também irá aumentar de dois para três IAS - indexante de apoios sociais, o que significa, a valores actuais, que aumenta de 1045 para 1567,5 euros. No caso de filhos com cancro, o subsídio vai aumentar para 100% da remuneração, sem qualquer limite máximo.

Fonte: Público

quarta-feira, 19 de novembro de 2025

Dificuldades de leitura: um problema que exige resposta imediata nas escolas

Segundo um artigo de Andreia Sanches, um estudo recente que avaliou mais de 92 mil alunos do 2.º ano do ensino básico revela que cerca de um quarto das crianças apresenta dificuldades de leitura. O mesmo estudo indica que os rapazes obtêm resultados superiores às raparigas e que os alunos das escolas privadas têm desempenhos melhores do que os das escolas públicas. Estes dados, porém, exigem uma leitura cuidada, pois refletem realidades educativas, sociais e estruturais que vão muito além da performance imediata dos alunos.

A perceção de que os rapazes são melhores na leitura não corresponde ao que a investigação internacional revela: de forma consistente, as raparigas superam os rapazes na competência leitora. As diferenças encontradas no estudo podem resultar de fatores como preconceito de género na avaliação, maior encaminhamento de rapazes devido a comportamentos perturbadores ou ainda práticas educativas que favorecem determinados perfis de desempenho. Outro fator possível é a recente transição dos testes em papel para formatos digitais, que alguns estudos sugerem poder beneficiar os rapazes em determinadas tarefas, alterando assim os padrões habituais de desempenho.

Também a diferença entre escolas públicas e privadas não deve ser interpretada de forma linear. A investigação mostra que uma parte importante do desempenho mais elevado nas escolas privadas resulta da composição social mais favorecida do seu corpo discente. Alunos provenientes de contextos socioeconómicos mais elevados tendem, por razões multifatoriais, a apresentar melhores resultados escolares, independentemente da eficácia pedagógica da escola que frequentam. Assim, a homogeneidade social mais elevada das escolas privadas contribui para elevar os seus resultados médios. Isto significa que, em muitos casos, mesmo que a sua eficácia pedagógica não seja superior à das escolas públicas, os alunos das escolas privadas continuam a apresentar desempenhos elevados devido às condições socioeconómicas e culturais de origem.

Um outro fator a considerar é o de que uma parte significativa das dificuldades de leitura observadas no estudo pode relacionar-se com as dificuldades de aprendizagem específicas (DAE). Estas desordens de origem neurobiológica são permanentes e afetam cerca de 15% das crianças em idade escolar, atingindo 5% nos casos mais severos, o que corresponde, no nosso país, a cerca de 50 mil alunos. As DAE afetam o processamento da informação, interferindo na receção, integração e expressão de estímulos visuais, auditivos, linguísticos ou motores. A literatura é clara: quanto mais precoce for a identificação — idealmente no final do 1.º ou 2.º ano— mais eficaz é a intervenção, podendo permitir que 75 a 90% destes alunos atinjam níveis de sucesso idênticos aos dos colegas sem DAE.

A falta de recursos especializados, a formação limitada de docentes e outros agentes educativos, lacunas legislativas e a perceção insuficiente de alguns pais sobre a relevância destas intervenções reforçam esta vulnerabilidade. As dificuldades de leitura nos primeiros anos tendem a condicionar a aprendizagem em todas as disciplinas, afetar a autoestima e a motivação e limitar oportunidades académicas e profissionais futuras.

Neste contexto, os resultados do estudo não surpreendem. Revelam tanto a iniquidade do sistema como a incapacidade estrutural de garantir respostas eficazes e equitativas. A leitura é muito mais do que um indicador escolar: é a base para o desenvolvimento intelectual e cívico. Garantir que todas as crianças aprendem a ler bem, no tempo certo, é uma responsabilidade coletiva — e urgente. O país não pode continuar a aceitar que dezenas de milhares de crianças vejam o seu potencial comprometido por falhas evitáveis do sistema.

Luís de Miranda Correia

Fonte: Público em acesso livre

7.ª Edição ROMA Educa | Candidaturas abertas

O período de candidaturas ao Programa ROMA Educa abriu esta quarta-feira, dia 19 de novembro de 2025, prolongando-se até ao dia 12 de dezembro, às 18 horas.

Sendo a educação considerada um pilar básico para o desenvolvimento pessoal e para a integração social das pessoas ciganas, a Agência para a Integração e Asilo, I.P., lança a 7.ª edição do programa ROMA Educa, que visa atribuir 210 bolsas de estudo para o apoio à frequência e permanência do 3.º ciclo do ensino básico e ensino secundário de estudantes provenientes das comunidades ciganas, no ano letivo de 2025/2026.

Podem aceder a este programa estudantes provenientes de comunidades ciganas, residentes em território nacional, que estejam matriculados/as e a frequentar o 3.º ciclo do ensino básico (7.º, 8.º e 9.º ano de escolaridade) ou o ensino secundário (10.º, 11.º ou 12.º ano de escolaridade), ou ainda curso equiparado a estes níveis de ensino (com exceção dos cursos do Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP) e Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências Escolares (RVCC)) e que tenham até 23 anos de idade, inclusive, à data da apresentação da candidatura

As candidaturas devem ser apresentadas até ao dia 12 de dezembro, às 18 horas, através do preenchimento e submissão do formulário online e dos restantes documentos previstos no número 1 do artigo 10.º do Regulamento:

a) Documento comprovativo da matrícula no 3.º ciclo do ensino básico (7.º, 8.º e 9.º anos de escolaridade) ou no ensino secundário (10.º, 11.º ou 12.º anos de escolaridade), ou ainda em curso equiparado a estes níveis de ensino, relativamente ao ano letivo 2025/2026;

b) Carta de motivação para a frequência do Programa ROMA Educa, redigida por cada candidato/a, na qual deverá ser demonstrada a sua proveniência de comunidades ciganas (sem modelo definido);

c) Declaração de compromisso, na qual ficarão expressas as obrigações a que os/as bolseiros/as se comprometem por força da atribuição das bolsas de estudo (anexo do Regulamento, disponível no site da candidatura).

Qualquer candidatura que não seja acompanhada de todos os documentos que a instruem poderá ser excluída do processo de análise.

O formulário encontra-se disponível em: https://dsroma.limesurvey.net/645316?lang=pt

Documentação e mais informação em: https://aima.gov.pt/pt/noticias/roma

Para qualquer esclarecimento: roma@aima.gov.pt

terça-feira, 18 de novembro de 2025

Saúde Mental/Suicídio: É necessário «mais pele real» e menos «pele virtual» nas relações, afirma Vítor Cotovio


O psiquiatra Vítor Cotovio afirmou que é necessário “mais pele real” nas relações para prevenir depressões e tentativas de suicídio, lembrando que “o que funciona melhor é o que está interligado”.

“Esta ligação, esta interceção, este carácter sistémico de olhar para o problema e ajudar a resolver faz com que as coisas sejam mais bem-feitas”, disse o diretor do Departamento Clínico e Técnico Assistencial do Instituto de São João de Deus, esta segunda-feira, em entrevista à Agência ECCLESIA.

Vítor Cotovio considera que se vai tendo a “sensibilidade de valorizar a importância da saúde mental” nas suas várias vertentes e naquilo que são as suas “consequências mais complicadas”, nomeadamente a “ideação suicida, tentativas de suicídio, ou suicídio”.

“Sabemos que o suicídio ocorre mais nas pessoas que tenham uma doença psiquiátrica de base, não quer dizer que ocorra só, nomeadamente as depressões. A depressão é uma doença de muitos ‘d’s: depressão, desespero, desalento, desesperança, desvalor, desistências”, explicou o psiquiatra e psicoterapeuta.

Segundo a Organização Mundial da Saúde, todos os anos, cerca de 720 mil pessoas tiram a própria vida; mais de metade dos suicídios globais (56%) ocorre antes dos 50 anos, sendo particularmente afetada a faixa etária dos 15 aos 29 anos.

O tema da prevenção do suicídio foi lembrado pelo Papa Leão XIV, no apelo que faz no vídeo deste mês de novembro, na apresentação da intenção mensal de oração.

Para Vítor Cotovio, é necessário garantir “atempadamente que as pessoas possam ter o apoio necessário”, desde o apoio que cada um poderia “garantir aos outros, se a vida não fosse tão acelerada”, se cada um fosse mais disponível, “e não houvesse tanta pele virtual e mais pele real”.

Vítor Cotovio acrescentou, neste contexto, que ‘pele’ é “presença, escuta, ligação/laços, empatia/esperança”, e alertou para os riscos de “uma comunidade virtual não filtrada”, porque qualquer jovem tem “uma necessidade enorme de pertença”, e os grupos com que ele se cruza nas redes sociais podem desvirtuar “a essência das coisas”, porque “ele escolhe pertencer mesmo que corra riscos”.


Se é verdade que não devemos endeusar as tecnologias digitais, também é verdade que não as devemos diabolizar, mas, atenção, este equilíbrio é fundamental. Os pais, os professores não podem passar procuração às tecnologias digitais naquilo que é o processo educacional.”

O Papa Leão XIV convocou as comunidades católicas a um esforço conjunto na prevenção do suicídio, na sua intenção de oração para este mês de novembro, e pede que as pessoas saibam estar próximas, “com respeito e ternura, ajudando a curar feridas, criar laços e abrir horizontes”.

O diretor do Departamento Clínico e Técnico Assistencial do Instituto de São João de Deus destacou a expressão “muito interessante” do Papa para ‘criar laços e abrir horizontes’, porque é “fundamental”, quando se refere aos jovens, que precisam “de presença e de pertença”.

Na entrevista transmitida no programa ECCLESIA desta segunda-feira, 17 de novembro, Vítor Cotovio explicou que “não é incompatível” ter a ajuda espiritual de um sacerdote e também a de um terapeuta.

Fonte: Agência Ecclesia por indicação de Livresco

sábado, 15 de novembro de 2025

Mariana é médica, surda e a primeira nativa de língua gestual no SNS

Mariana Couto Bártolo nunca ouviu um som na vida. A surdez passou despercebida quase até aos dois anos, mas o diagnóstico foi contundente: “Surdez neurossensorial profunda.” Aos 29 anos, é médica interna no ano comum de formação – é médica com surdez profunda desde que nasceu e a primeira falante nativa de língua gestual portuguesa no Serviço Nacional de Saúde (SNS). Diz que ser surda lhe dá “uma sensibilidade e uma maneira diferente de observar os doentes”.

A médica, nascida em Setúbal e criada em Lisboa, conseguiu “mascarar” a surdez até aos dois anos – “vivia numa casa antiga com soalho de madeira e, quando sentia as vibrações, do chão virava-me” —, mas foi denunciada pelo ladrar de um cão: “Na creche havia um cão que ladrava sempre que os pais iam buscar as crianças”, recorda. Todas as crianças reagiam quando ouviam o cão, excepto Mariana, que continuava absorta nas suas brincadeiras.

Ironicamente (ou não), o seu primeiro sonho foi ser médica veterinária. Só no 9.º ano é que mudou de ideias, depois de uma professora de Matemática lhe ter “plantado a semente” da Medicina. “Esta professora perguntou-me por que é que eu não considerava ser médica e ajudar outras pessoas surdas”, lembra. E assim foi.

O percurso até lá chegar foi “desafiante”. Em conversa com o P3, lembra que as barreiras tiveram de ser ultrapassadas com “criatividade”, mesmo no curso de Medicina da Universidade Nova de Lisboa. As aulas tinham de ser “gravadas e transcritas” em conjunto com os colegas, que também reviam “o conteúdo cientificamente”.

O exame oral da “temível cadeira de Anatomia” foi outro dos momentos que lhe ficaram na memória: o professor não acedeu ao pedido de uma avaliação por escrito. “Não por discriminação”, ressalva, mas porque achou que reunia condições para a prova oral.“No dia do exame estava muito assustada, sobretudo porque não me ia expressar de uma forma que é natural para mim — tenho voz de surda”, confessa.

“Deaf gain”

Foi com esforço (e uma boa dose de criatividade) que chegou ao consultório. Hoje, admite, a comunicação com os doentes pode tornar-se desafiante, mas isso não a assusta: “Ao longo de toda a minha vida sempre me adaptei aos outros, tentando várias formas de comunicar até me entenderem”.

“Começo pela via oral, esclarecendo que sou surda e que faço leitura labial. Se me compreenderem e eu a eles, o que acontece na maioria dos casos, o atendimento prossegue assim”, exemplifica. Quando a comunicação não é clara, escrever num papel ou no computador as perguntas que precisa de ver esclarecidas é a estratégia que usa.

No contacto com os doentes, acredita que a surdez a dotou de uma “sensibilidade” e forma de observar as pessoas e a sua expressão facial que se revela muito útil. Explica que na comunidade surda existe o conceito de deaf gain, que alude à surdez não como uma deficiência, mas como algo positivo e vital para a diversidade humana, o “reconhecimento e valorização das experiências e habilidades únicas das pessoas surdas”, esclarece Mariana.

Ainda há quem acredite que Mariana não pode “exercer qualquer especialidade, especialmente as que envolvem muita comunicação”, mas a médica rejeita essa opinião: são “barreiras impostas pela sociedade e pelo que é considerado a norma” e que podem ser facilmente ultrapassadas, especialmente com o recurso à tecnologia.

“Tenho as mesmas responsabilidades do que qualquer outro colega no mesmo patamar e cumpro as minhas funções com rigor.”

A língua gestual como primeira língua

A principal diferença surge quando, à sua frente, encontra alguém que também é surdo. É a primeira médica falante nativa de língua gestual portuguesa e, na comunicação com doentes surdos (especialmente nos casos mais complexos de doentes oncológicos ou internamentos psiquiátricos), já teve um papel essencial.

“A informação, transmitida com clareza, pode ser um factor determinante para a forma como os doentes surdos controlam e encaram o seu estado de saúde”, acredita. “Ainda há um longo trabalho por fazer” no SNS para que as pessoas surdas “possam ter acesso universal à saúde”, admite.

Essa diferença sente-se não apenas no acesso à saúde, mas também no acesso à educação. Depois de ter passado os primeiros anos de formação no Instituto Jacob Rodrigues Pereira (com ensino especializado para crianças surdas), a médica escolheu o ensino regular e chegou a ter “algumas horas de aulas por semana com recurso a intérpretes de língua gestual portuguesa”. Contudo, Mariana descobriu que “não gostava desse tipo de comunicação”, por ver o intérprete como um “intermediário”.

Preferindo sempre uma comunicação directa com as pessoas, optou, a partir do 9.º ano, por não ter intérprete nas aulas e esclarecer as suas dúvidas directamente com os professores.

Para ela, um ensino verdadeiramente eficaz para crianças surdas, que se equipare ao de crianças ouvintes, “tem de incluir o bilinguismo o mais precocemente possível”. É através da exposição constante, “tanto na escola como em casa”, com o português escrito e com a língua gestual portuguesa enquanto língua materna que as crianças surdas conseguem “ter um bom contacto com o mundo que as rodeia” e atingir o mesmo nível de aproveitamento escolar “que as demais crianças”, refere Mariana Bártolo. (...)

Continuação da notícia em Público com acesso livre