sábado, 8 de junho de 2019

Viver com dislexia: o relato de uma jornalista da CNN

Robyn Curnow, recentemente diagnosticada com dislexia, que descreve como "uma forma alternativa de pensar", partilhou a sua experiência enquanto profissional

"Como duas faces de uma moeda, a dislexia é um dom e uma luta. Eu sei disso porque sou disléxica, tal como a minha filha mais nova também o é. É genético e extremamente comum. Estima-se que uma em cada cinco pessoas tem dislexia”, começa por explicar a jornalista e pivô.

"A dislexia é, simplificando, um modo de funcionamento diferente do cérebro. Não indica o nível de inteligência. Os cérebros disléxicos têm dificuldade em reconhecer como é que os sons, as palavras e as letras combinam foneticamente. É uma forma alternativa de pensar", acrescenta.

Enquanto aluna, não foi fácil adaptar-se a um sistema de ensino que não estava preparado para alunos com necessidades especiais. A jornalista conta como os testes de ortografia, técnicas de memorização baseadas na repetição, a leitura em voz alta na sala de aula e os testes de avaliação tradicionais, funcionam, como já sabemos, contra os disléxicos no contexto académico. No entanto, fora da sala de aula tradicional, muitos disléxicos prosperam. "Embora as mentes disléxicas processem a informação de forma diferente, isso também significa que estamos a cantar uma melodia diferente quando se trata de literacia, memória e concentração", diz.

Os seus primeiros anos na escola foram “uma luta”, como para qualquer disléxico, resume Robyn Curnow. Os pais e professores não estavam sensibilizados para este tipo de casos ou suficientemente informados para compreender que era um distúrbio comum. "Eles pensaram apenas que eu não era muito inteligente", explica.

“Eu era tão má a escrever que no segundo ano a minha professora criou um nível extra de fracasso num boletim de avaliação em particular. Ela achou que 'insuficiente' não captava bem o meu nível de capacidade. Então, criou uma categoria adicional, 'extremamente insuficiente', só para mim. Essa mesma professora ficou tão frustrada com a minha ausência de progresso nos problemas de matemática que me atirou com o livro a meio da aula”, recorda.

“A culpa das minhas dificuldades também foi atribuída a ser 'demasiado nova' para a minha turma, então repeti o segundo ano. Quando cheguei aos 10 anos de idade já tinha andado em 4 escolas diferentes porque os meus pais tentaram encontrar um ambiente de aprendizagem no qual eu encaixasse. Tu nunca esqueces aquela humilhação tão precoce de ser o último a acabar na sala de aula ou de ter um professor a atirar-te com um livro”.

Apesar de muitas crianças disléxicas ainda terem histórias semelhantes para contar, houve uma enorme evolução, entretanto. Só agora, já adulta, e depois de a sua filha mais nova ser diagnosticada, na sequência de um alerta de uma professora atenta, é que Robyn foi também diagnosticada com dislexia e percebeu a injustiça a que esteve sujeita durante todos estes anos.

No estado americano da Georgia, onde vive a jornalista, uma nova lei tornou obrigatório realizar o teste da dislexia a todas as crianças. Cada vez mais, os alunos recebem ajuda especializada na sala de aula desde cedo - enquanto as crianças ainda estão a aprender a ler, e não a ler para aprender.

No que toca ao sucesso profissional, como cada um pode escolher rumos diferentes para a sua carreira, é mais fácil para os disléxicos serem bem sucedidos, e o que não faltam são bons exemplos disso. A par disso, o conhecimento em relação a este distúrbio contribuiu para que se compreendessem as vantagens de pensar de forma diferente. Os disléxicos pensam frequentemente com base em imagens, razão pela qual são geralmente excelentes arquitetos, jardineiros, cozinheiros ou astrónomos. Paradoxalmente, os disléxicos lutam para escrever corretamente, mas são frequentemente excelentes autores, como é o caso de Roald Dahl e Agatha Christie. Têm uma imaginação fértil, são altamente criativos, ótimos a resolver problemas e possuem uma aptidão natural para comunicar, tudo isso qualidades importantes para os empregadores das mais diversas áreas.

"Felizmente, caí numa carreira que, penso eu, é um emprego de sonho disléxico. Nos noticiários televisivos, o nosso trabalho é pensar em imagens, porque a televisão é um meio visual. E como repórter de televisão, escreves guiões breves e curtos para as imagens. O público só ouve e vê a reportagem, por isso a ortografia e a gramática não são tão importantes como são para, por exemplo, um artigo de jornal", conta Robyn Curnow sobre o seu trabalho na CNN.

A jornalista deixa ainda um conselho para os outros pais: “Se o seu filho está constantemente a ser aconselhado a esforçar-se mais, a escrever melhor ou a deixar de ser preguiçoso, então talvez seja necessário levá-lo a fazer os teste para o distúrbio de aprendizagem mais comum do mundo.”

Fonte: Visão

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