Iniciada a
segunda década do século XXI, temos a bater-nos à porta a terceira vaga da
revolução digital. Ela aí está, mais enérgica que qualquer das outras, a
deixar-nos cada vez mais interdependentes, a mudar tudo à nossa volta, a
mergulhar-nos num mundo de ficção, de perplexidade e de imaginário.
A
primeira vaga foi sustentada pela popularização e democratização dos
computadores pessoais e dos telemóveis; a segunda, pela massificação do acesso
à Internet e da oferta low cost da banda larga; a terceira está a
ser protagonizada pela redução de todas as fontes da cultura, do saber e do
lazer ao formato digital, acompanhada pela vulgarização do comércio electrónico
de bens e serviços, também eles em formato digital. A tendência é apetecível,
as novas gerações de consumidores já lhe deram o seu consentimento, logo, o
caminho anuncia-se irreversível. Sem ilusões: nada mais vai ser como dantes…
Mais
depressa, e de forma mais eficaz e definitiva, do que os CDs substituíram
os discos de vinil, a música em formato digital fará desaparecer, num
curtíssimo espaço de tempo, o suporte musical em formato de CD. Hoje,
quem entrar num quarto de um adolescente já não vê caixas de CDs, nem
livros espalhados por todo o lado. A música e os textos circulam em suportes digitais, configurados em leitores Mp3, em Pen
Flash Drives, SDcards, discos rígidos externos, em leitores tipo Kindle,
ou mesmo nas “nuvens”,com os novos servidores tipo cloud. de
armazenamento quase ilimitado e disponíveis em qualquer parte do mundo…
E os
filmes também. Não se vai à loja, à discoteca ou à livraria formais. Vai-se à Net
e faz-se um download, legal ou ilegal, tanto faz, desde que cumprido
o objectivo. Permutam-se discos, filmes e textos à velocidade de um clic, toma
lá, dá cá. Uma parte das revistas e livros em suporte de papel têm os dias
contados. As bases de dados digitais constituirão uma fonte inesgotável de
conhecimento ao alcance dos dedos de uma das mãos. Devido a isso, o crescimento
do conhecimento vai evoluir de uma forma exponencial. A humanidade poderá
combater melhor as desigualdades, as doenças, a fome, a miséria, o nepotismo e
todas as formas de degradação do Homem. A humanidade poderá, ainda, ser una e
mais solidária, face ao desenvolvimento social e ao progresso científico
proporcionado por esta revolução digital.
A Amazon
divulgou que mais de 50 por cento dos livros vendidos o foram já em formato
digital (e-books). Ao preço de um telemóvel pode-se comprar um gadget (O
Kindle, da Amazon, por exemplo) armazenador e leitor de revistas
e livros com capacidade para guardar uma biblioteca de cerca de mais quatro mil
volumes. Estes livros e revistas podem ser adquiridos on-line, por wireless,
ou 3/4G a preços populares, devido à óbvia diminuição de custos, em livrarias
virtuais. Pouco faltará para que se possa trazer no bolso a biblioteca de
Oxford, com possibilidade de aceder aos textos através de um motor de busca à
base de palavras-chave. Mais de 60 mil filmes são alugados ou comprados no iTunes
todos os dias. A publicidade na Net já alcançou mais de metade do
valor investido nos meios tradicionais de comunicação social…
Aviso:
não se trata do fim dos livros, jornais e revistas em suporte de papel. Como
não o foi o anunciado fim dos discos de vinil. Mas é um novo renascer dos
modelos de divulgação da cultura, da informação e da ciência, só comparável ao
renascimento proporcionado, nos finais da época de quatrocentos, pela prensa de
Gutenberg. Um novo renascimento que possibilitará crescimentos culturais e científicos
em ordem geométrica, dada a possibilidade de divulgação da informação de forma
generalizada e em poucos segundos.
E a escola? E os professores e educadores? Já o
afirmámos variadíssimas vezes: vivemos um tempo que pretende reconfigurar a
sociedade e a escola, atribuindo-lhe um novo formato, centrado em renovadas
formas de receber e transmitir a informação. Isto implica uma busca permanente
do conhecimento disponível e das suas fontes de informação. Para alcançar tal
objectivo, imputa-se à escola mais uma responsabilidade: a de contribuir
significativamente para que se atinja o que se convencionou designar por
analfabetismo digital zero.
Para
tal, a educação para a utilização das novas tecnologias digitais precisa ser
planeada, com base no conhecimento pedagógico, desde o jardim-de-infância. Sem
preconceitos ou desnecessárias coacções, sem substituir atabalhoadamente o
analógico pelo digital, mas sim reforçando a capacidade cognitiva dos alunos e
guiando a descoberta de novos horizontes. Formando os professores e equipando
as escolas. Este movimento deve ser capaz de preparar os jovens para serem
leitores críticos e escritores aptos a desenvolver essas competências em
qualquer dos meios suportados pelas diferentes tecnologias.
Os
professores da designada geração digital também já estão a chegar às
escolas. E, com eles, as mudanças pedagógicas vão ser mais rápidas, porque
baseadas no domínio de novas competências, na experiência e na forte motivação
para o uso das novas tecnologias. A escola tradicional vai mudar. Desde logo
necessitará de menos espaços físicos. Através da comunicação on-line, o
contacto com o mundo exterior e com as outras escolas da aldeia global será
permanente. Desta “conexão” de escolas globais – as connecting classrooms - resultarão
aprendizagens, também elas globais, e em simultâneo, proporcionadas pelos
vários docentes globalizantes, porque globalizadores do conhecimento e da
tutoria dos aprendentes.
O que vamos
fazer do “pátio dos recreios” quando, nos intervalos, os jovens já só se
confinarem à manipulação dos smartphones ou das tablets? A
resposta depende de acreditarmos, ou não, de que a escola nunca deixará de ser
a Escola e de que nós nunca deixaremos de ser Professores.
João Ruivo
Recebido por correio eletrónico
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