terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

Bullying: prática que acompanha gerações e não escolhe sexos

O bullying "não é um fenómeno recente, mas fala-se mais do que antes" desta problemática. Tânia Paias, psicóloga clínica e autora do livro "Bullying - Tenho Medo de Ir à Escola", explica (...) que não há nenhum fator económico ou social associado ao bullying, que a prática é "transversal" a estas condições. "O que pode variar é a modalidade de perpetuação", explica.


De acordo com vários estudos, 40% dos jovens portugueses já se envolveram em alguma dinâmica de bullying seja no papel de vítimas seja de agressores. Ainda no início deste ano, um jovem de 15 anos, em Braga, suicidou-se alegadamente devido a maus-tratos na escola. O caso está a ser investigado pela Inspeção-Geral de Educação e Ciência. O próprio ministro da Educação, Nuno Crato, considera esta prática um "fenómeno intolerável".

Apesar de não ser recente, o bullying tornou-se mais conhecido porque a sociedade está mais sensibilizada e menos tolerante, o que leva a que certos comportamentos sejam agora detectados com mais facilidade. Também a divulgação destas práticas levou vítimas de bullying agora adultas a perceber o que lhes ocorreu na infância ou adolescência.

A diretora do PortalBullying afirma que podem ser compreendidas como atos de bullying todas as ações que são "continuadas no tempo, com intenção de infringir dano ou medo".

No livro, lançado a 31 de janeiro, Tânia Paias explica que "não será uma zanga entre colegas que se poderá conotar com bullying, não é uma brincadeira de mau gosto que fará com que estejamos perante o fenómeno, pois este requer que haja premeditação e intimidação continuada".

Também o género influencia a forma como este é praticado. O sexo masculino é mais impulsivo fisicamente enquanto o feminino "utiliza mais a palavra, a difamação e a exclusão do grupo".

O agressor tem, "na maioria dos casos, dificuldade na gestão dos impulsos" e "em conhecer os limites", enquanto as vítimas "têm dificuldade em dizer 'não', em exteriorizar".

As diferenças são explicadas (...) pela psicóloga: "Se por um lado uns ficam com tudo internamente, os outros põem tudo no exterior."

PRÉ-ESCOLAR A dinâmica de bullying pode estar presente desde o pré-escolar, e é nesta idade que os pais devem começar a estar alerta. "Os primeiros anos de escolarização são determinantes para o salutar desenvolvimento das crianças. É aqui que se iniciam os primeiros conflitos, dúvidas, inseguranças e incapacidades", explica a autora no livro. "A idade pré-escolar e os anos pré-escolares são fundamentais para adquirir uma conduta de funcionamento com os colegas, pois é aqui que nos vamos descentrando da nossa posição e aceitando a posição do outro", acrescenta.

Já no primeiro ciclo, "as características individuais começam a emergir e vão dando cunho ao tipo de relações que se estabelecem entre as crianças". Uma intervenção de pais e educadores nestas idades faz com que se "evitem dificuldades de maior na adolescência".

ADOLESCÊNCIA Muitas das questões associadas ao bullying podem confundir-se com a própria adolescência.

No seu livro, Tânia Paias explica que "a mudança de atitude, as alterações de temperamento, a irritabilidade extrema e o isolamento" podem ser característicos dos jovens numa idade em que há também uma alteração na dinâmica entre pais e filhos. Mas estes comportamentos podem ainda ser indícios de que algo não está bem. Numa altura em que a identidade do jovem se está a formar, é fundamental manter uma comunicação saudável.

O acompanhamento de pais, professores, diretores e de todas as outras pessoas que participam no espaço escolar é fundamental para a vítima, explica a psicóloga (...): "Devem trabalhar com ela para que consiga recuperar a sua segurança, o amor-próprio e a capacidade de resposta."

Caso os pais suspeitem que o filho está a ser vítima de bullying, devem "conversar com ele e ir falar com o diretor de turma". A directora do PortalBullying indica o caminho a seguir: "Devem sempre falar com os filhos, referir que se estão a aperceber de que algo não está bem e que em conjunto vão fazer tudo para acabar com o sofrimento."

Os estudos sobre bullying evidenciaram ainda a necessidade de encarar esta problemática não só de um ponto de vista individual mas também do contexto em que o jovem se insere. Para lá das questões de educação, há que estar atento às amizades.

Mas esta prática não diz respeito apenas à violência física ou psicológica a que uma criança ou um jovem estão sujeitos na escola. Também o cyberbullying - que recorre às tecnologias de informação e comunicação e que ocorre através do envio de mensagens para o telemóvel e publicação de mensagens e imagens nas redes sociais ou blogues - cresceu nos últimos anos.

De modo a tentarem evitar este género de violência, os pais deverão "estar atentos à movimentação dos filhos e ao que consultam na internet", explica Tânia Paias (...), acrescentando que "é necessária uma liberdade controlada", o computador "num local comum, a que os pais possam ter acesso".

No caso do cyberbullying, o inimigo não tem rosto. Em termos psicológicos trata-se de uma agressão mais dura, "porque a humilhação, o gozo, chegou a todos. A proliferação da informação é imediata e todas as esferas do jovem ficam afectadas", diz a especialista.

IDADE ADULTA O bullying sofrido na infância ou na adolescência afeta as pessoas na idade adulta. Segundo Tânia Paias, "é a fase de construção da identidade, das amizades, da estabilidade, da segurança. Quem vive este período com medo, com receio do que lhe pode acontecer, zangado consigo mesmo porque não se consegue defender, com uma agressividade contida, desconfiada de todos, naturalmente irá tornar-se um adulto com dificuldade nas relações sociais, em confiar e gerir adequadamente as suas emoções".

Para mais informações sobre  os sinais a ter em conta e glossário ver na página do jornal I.

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