segunda-feira, 13 de maio de 2024

A importância do conhecimento lexical na leitura e escrita: um estudo sobre estratégias de intervenção com crianças do 2.º ano de escolaridade

A investigação tem indicado que o conhecimento lexical exerce uma influência significativa na competência de leitura e escrita. A aplicação deste dado científico desempenha um papel fundamental no desenvolvimento de estratégias de ensino eficazes. Neste sentido, Incognito e Bigozzi (2023) analisaram a eficácia de um conjunto de estratégias de intervenção em sala de aula para o desenvolvimento do conhecimento lexical de alunos do 2.º ano de escolaridade. Os resultados obtidos revelam benefícios significativos do treino lexical para a promoção da precisão da leitura e da escrita. O estudo, intitulado «Influence of lexical development on reading and spelling skills: Effects of enhancement on second-grade children in primary school», foi publicado na revista Children.


Introdução

O conhecimento lexical exerce, desde tenra idade, uma influência significativa na competência de leitura e escrita. Mas no que consiste exactamente o conhecimento lexical? O conhecimento lexical consiste, muito simplesmente, no conhecimento de palavras. Porém, este conhecimento vai além do reconhecimento de palavras isoladas. Envolve a compreensão profunda e organizada do seu significado, assim como dos respectivos conceitos e definições.

De acordo com a literatura, promover o conhecimento lexical influencia significativamente a aprendizagem da leitura e escrita. Segundo diversos estudos (Andrews, 2008; Bigozzi & Biggeri, 2000; Caro & Mendinueta, 2017; Bigozzi et al., 1997), o aumento do número de palavras do repositório lexical dos alunos melhora a compreensão da leitura, a fluência verbal, a velocidade de leitura e a precisão da leitura e escrita.

O desenvolvimento do conhecimento lexical é considerado um processo natural e contínuo, com início na pronúncia das primeiras palavras. Embora, durante os primeiros anos da criança, a aquisição e o enriquecimento vocabular dependam estritamente das oportunidades de escuta e fala no contexto familiar, após a entrada na educação (pré-)escolar, dependem significativamente do ensino e da prática neste contexto. Neste sentido, diversos estudos têm destacado a importância do ensino intencional do conhecimento lexical, propondo uma intervenção nos processos cognitivos envolvidos na aquisição do léxico (Loftus-Rattan et al., 2016; Seven et al., 2019).

O estudo de Incognito e Bigozzi (2023)

O modelo multidimensional de representação lexical (do inglês Multidimensional Model of Lexical Representation; Boschi et al., 1992) descreve os processos envolvidos na expansão lexical ao longo do desenvolvimento, propondo que, numa fase inicial, as crianças dominam definições simples e elementares, associadas a aspectos concretos e superficiais das palavras, como, por exemplo, redundâncias. Já no decorrer do crescimento, as crianças adquirem competências mais complexas, semelhantes às dos adultos, tais como as competências de nomeação e identificação de sinónimos e antónimos. Com base neste modelo, Incognito e Bigozzi (2023) desenvolveram um programa de intervenção com o objectivo de promover o conhecimento lexical de crianças do ensino básico.

Embora a importância do conhecimento lexical esteja bem estabelecida na literatura, em sistemas escolares como o italiano (citado no artigo), os métodos de ensino geralmente utilizados para aumentar o léxico dos alunos consistem em actividades estruturadas (e. g., actividades de memorização de palavras específicas), focadas mais no crescimento quantitativo (i. e., número de palavras conhecidas) do que no enriquecimento qualitativo (i. e., compreensão profunda e abrangente das palavras). Considerando a importância desta última dimensão, Incognito e Bigozzi (2023) analisaram a eficácia de uma intervenção no conhecimento lexical, focada na aprendizagem e compreensão profunda de palavras. Mais especificamente, os investigadores pretenderam analisar a eficácia da intervenção i) no desenvolvimento da compreensão de texto, velocidade, e precisão de leitura (competência de leitura), e ii) no desenvolvimento da precisão ortográfica (competência de escrita).

Participaram no estudo 74 crianças do 2.º ano de escolaridade de uma escola primária italiana. As crianças foram divididas em dois grupos: i) um grupo experimental com 34 alunos, que foi alvo de intervenção, e ii) um grupo de controlo com 40 alunos, que receberam apenas o ensino regular em sala de aula.

Todas as crianças foram avaliadas individualmente, antes e no final da intervenção, na compreensão de texto, na velocidade de leitura, na precisão de leitura e na escrita. A intervenção foi implementada por um professor, uma vez por semana, com sessões de duas a três horas, durante seis meses. As sessões foram organizadas por dificuldade crescente, e as actividades contemplaram a leitura e a análise de contos de fadas, como o Capuchinho Vermelho, seguidas dos exercícios de treino lexical que se elencam:
  • exercícios para ultrapassar tendências assimilativas, com o objectivo de ajudar as crianças a superarem definições simples e elementares, características da infância;
  • exercícios de enriquecimento vocabular, direccionados para a promoção de processos inerentes à expansão do vocabulário, como a categorização, funcionalização, sinonímia e antonímia. Em concreto, as crianças definiam as palavras-alvo, incluindo-as em categorias, seguindo-se a organização hierárquica em categorias de nível superior (e. g., «cães são animais») e inferior (e. g., «um dálmata é um cão»). Paralelamente, as crianças foram estimuladas a definir palavras de acordo com as experiências dinâmico-funcionais dos objectos, isto é, a identificar, com base em experiências anteriores, as funções dos objectos assim como as acções que estes permitem realizar;
  • exercícios para enriquecer a capacidade de contextualização, com o objectivo de melhorar a qualidade do léxico através do conhecimento das regras que relacionam as palavras entre si. As crianças foram assim incentivadas a usar o contexto para entender não apenas o significado das palavras aprendidas, mas também os diferentes significados de cada palavra.
Principais resultados e conclusões

A intervenção implementada melhorou a compreensão da leitura e diminuiu os erros de leitura e escrita. Segundo os autores (Incognito & Bigozzi, 2023), este efeito pode ser explicado pelo fortalecimento da via semântico-lexical, tal como proposto pelo modelo da dupla via (Coltheart et al., 1993; Coltheart et al., 2001). Especificamente, a intervenção conduziu a um aumento do número de palavras conhecidas, assim como do conhecimento das respectivas formas ortográficas e valor semântico (isto é, robusteceu a disponibilidade e o acesso das crianças à via semântico-lexical). Na leitura, estes ganhos favorecem a compreensão do vocabulário e um padrão articulatório mais célere e fluente. Na escrita, a expansão semântico-lexical permite, por sua vez, aceder directamente às representações ortográficas das palavras.

Com efeito, o desenvolvimento lexical baseia-se fundamentalmente na familiarização com palavras-alvo, na escuta das mesmas e na respectiva repetição em situações que permitam a sua assimilação. Os resultados da intervenção implementada por Incognito e Bigozzi (2023) podem ter surgido em sequência da exposição repetida às palavras-alvo e, não menos importante, da aprendizagem em contexto, considerando a evidência da eficácia desta estratégia.

Posto isto, o efeito positivo da intervenção no conhecimento lexical decorre, segundo os autores, da natureza dos exercícios aplicados, já que exigiram que as crianças se envolvessem, de forma activa, na leitura e escrita de palavras particularmente complexas (como, por exemplo, palavras homófonas) ou que requerem a respectiva organização em categorias. Além disso, os exercícios permitiram uma reflexão acerca das palavras-alvo e respectivos significados, possibilitando, por sua vez, contextualizar o léxico no processamento cognitivo-linguístico mais abrangente. Por último, a estimulação das vias fonológica e semântico-lexical permitiu que as crianças adquirissem informações relevantes para a codificação correcta das palavras em tarefas de leitura e escrita.

quinta-feira, 9 de maio de 2024

“Nova era no tratamento da surdez” : criança começa a ouvir depois de terapia genética

A neuropatia auditiva é uma condição que decorre de uma falha na condução dos impulsos nervosos que transportam as informações sonoras do ouvido interno para o cérebro. Esta perturbação na audição de Opal Sandy, de 18 meses, fez com que a criança fosse surda de nascença. Graças a uma inovadora terapia genética, a menina de Oxfordshire, em Inglaterra, já consegue ouvir.

Bastaram seis meses para que Opal, para além de conseguir ouvir sons suaves, como sussurros, já conseguisse dizer palavras como “mamã” e “papá”. Como conta o The Guardian, os pais da menina “nem conseguiam acreditar”. “Foi uma loucura”, afirmou Jo Sandy, mãe da criança.

O tratamento desenvolveu-se no Hospital de Addenbrooke, unidade hospitalar universitária e centro de pesquisa de Cambridge, que está a executar o ensaio clínico Chord (https://www.senselab.neurosciences.medschl.cam.ac.uk/our-research/chord-gene-therapy-clinical-trial). O estudo analisa o uso da terapia genética DB-OTO em crianças com mutações no gene OTOF (otoferlina). Através da terapia genética é fornecido ao ouvido interno dos pacientes uma versão funcional deste gene.

Opal Sandy realizou a cirurgia, que durou apenas 16 minutos, no ouvido direito. Foi-lhe também aplicado um implante coclear no ouvido esquerdo. Algumas semanas depois, a criança já conseguia ouvir sons altos, como palmas. 

Em declarações ao The Guardian, o professor Manohar Bance, cirurgião e principal responsável pelo ensaio, disse que este é apenas o início das terapias genéticas. “Isto marca uma nova era no tratamento da surdez”, sublinha o especialista. 

O ensaio clínico Chord consiste no teste de três crianças, Opal incluída, com a inserção do gene nas células através de um vírus, apenas num ouvido. Será aplicada a outras três crianças uma dose mais alta. Se for considerado seguro, mais crianças poderão receber a terapia em ambos os ouvidos, e ao mesmo tempo.

Uma segunda criança terá realizado recentemente o tratamento de terapia genética num hospital universitário de Cambridge, tendo obtido resultados positivos. No total, serão 18 crianças de vários países a serem recrutadas para o ensaio. Incluem-se os Estados Unidos, Reino Unido e Espanha. 

O professor Bance espera que a terapia possa ser aplicada a outros tipos mais comuns de perda auditiva: “Espero que possamos começar a usar terapia genética em crianças pequenas onde realmente restauramos a audição e elas não precisam de ter implantes cocleares e outras tecnologias que precisam de ser substituídas". 

Fonte: Público

Pais, alunos e professores de 35 escolas de Lisboa apontam problemas de acessibilidade

Um inquérito online promovido pelo movimento Cidadãos Por Lisboa no início deste ano concluiu agora que pais, alunos e professores de 35 escolas até ao 1.º ciclo de Lisboa consideram que existem problemas de acessibilidade e segurança nos acessos a esses estabelecimentos de ensino.

A vereadora Floresbela Pinto revelou à TSF que a ideia para este inquérito surgiu depois da aprovação por unanimidade, na Câmara de Lisboa, em outubro passado, de uma proposta para exigir mais segurança para as crianças.

"Como estávamos a ser contactados por várias entidades com curiosidade sobre a nossa proposta, decidimos fazer no período de um mês, no início deste ano, um inquérito, um questionário para tentar perceber quais eram os problemas específicos sentidos nas diferentes escolas da cidade. Tivemos, no período de um mês, mais de cem respostas de 35 escolas diferentes da cidade, sendo que 88% das respostas consideram que é necessário, de facto, alterar as condições do espaço público, condicionar o trânsito e dar resposta aos problemas de acessibilidade ou de segurança no acesso à escola", explicou Floresbela Pinto.

Os inquiridos pedem intervenções simples à autarquia liderada por Carlos Moedas para que as crianças tenham maior segurança nas deslocações para a escola. Para Floresbela Pinto é urgente limitar o trânsito junto a essas zonas ou até acabar com ele.

"Há sítios onde é possível cortar totalmente o trânsito, outros em que as pessoas têm mais facilidade em deixar as crianças num certo ponto junto à escola, mas que não cria ali um problema de trânsito, de acumulação de estacionamento em segunda fila. Ter as passadeiras bem sinalizadas, limitar apenas a um sentido de trânsito, pensar as questões e os métodos de acalmia de trânsito para reduzir a velocidade, porque a velocidade excessiva também foi assinalada como grande problema. Também nos foi assinalada a questão da necessidade de prolongamento das ciclovias e o aumento de estruturas junto às escolas para estacionamento de bicicletas", revelou a vereadora.

Floresbela Pinto diz que este é o momento certo para implementar as medidas, uma vez que o ano escolar está a acabar, e lembra que o problema de falta de segurança no acesso às escolas não é novo, acusando a Câmara de Lisboa de atrasar a solução.

"O resultado do inquérito foi apresentado hoje em reunião pública de câmara municipal e pudemos também ouvir por parte do presidente a manifestação de solidariedade com estes propósitos, o facto é que nós queremos passar das palavras para a ação porque, de facto, nos últimos anos aquilo que temos tido é um plano de acessibilidade pedonal que está completamente estagnado, que parou e nós sentimos que a nível da mobilidade a cidade não está a dar resposta efetiva àquilo que são as preocupações presentes. Não contribui para esse efeito o facto do plano de repavimentação da cidade ter sido descontinuado", acrescentou.

Fonte: TSF por indicação de Livresco

quarta-feira, 8 de maio de 2024

Como incentivar a escrita na sala de aula?

Introdução

Gerir a sala de aula constitui um desafio constante para os educadores. A este desafio, acresce a necessidade de motivar e envolver as crianças em actividades estruturadas, como é o caso das actividades de escrita para a promoção da literacia emergente. Quando se pretende motivar e incentivar cada criança no contexto colectivo da turma, a tarefa torna-se ainda mais desafiadora.

De acordo com Friddle e Ivey (2023), actividades interligadas de leitura e escrita de livros aumentam significativamente a probabilidade de as crianças considerarem a escrita uma competência valiosa e de a abordarem com entusiasmo. Além disso, essas actividades constituem uma prática social envolvente, crucial para o fortalecimento da relação com os pares e, consequentemente, da percepção de interacção ou relação (abordada no texto de apoio anterior).

Para apoiar educadores na promoção da escrita, Friddle e Ivey (2023) descreveram um conjunto de recomendações para associar explicitamente a leitura compartilhada de livros ilustrados a actividades de escrita.

Leitura compartilhada de livros ilustrados

Os livros ilustrados constituem ferramentas essenciais para a promoção e desenvolvimento da escrita composicional, assim como para a ligação social das crianças à comunidade que os escreve. De acordo com Friddle e Ivey (2023), entre os diversos benefícios da leitura compartilhada encontra-se a oportunidade de estabelecer relações explícitas entre a leitura e a escrita das crianças. Por essa razão, a leitura compartilhada de livros deve ocorrer diariamente. Os educadores podem, especificamente:

1. Estimular a leitura repetida de livros ilustrados. Após a primeira leitura, os educadores devem permitir que as crianças respondam com sinceridade às questões formuladas, sem se preocuparem se a resposta está correcta. De acordo com a experiência de Friddle e Ivey (2023), a escolha adequada dos livros ilustrados estimula as crianças a responderem voluntariamente. Além disso, segundo as investigadoras, observar a linguagem corporal, as expressões faciais e as reacções verbais pode ser uma boa estratégia para estimular e apoiar as crianças mais introvertidas a participarem na actividade.

Após a primeira leitura, os educadores devem ler o livro novamente. No entanto, desta vez, devem encorajar as crianças a prestar atenção às decisões dos autores e ilustradores. Devem, em concreto, chamar a atenção quer para a forma como os objectos e acções são representados, quer para os pensamentos e sentimentos das personagens. A consciência dos pensamentos e dos sentimentos das personagens do livro está intimamente relacionada com o desenvolvimento socioemocional das crianças. Além disso, influencia a sua compreensão e escrita. De acordo com a literatura, antes de aprenderem a ler, as crianças observam atentamente como as expressões faciais, a linguagem corporal e as imagens são representadas nos livros, o que pode influenciar a própria escrita.

2. Incluir livros sem palavras. É fundamental ter em consideração este aspecto: a linguagem escrita não é a única forma de transmitir e construir significado. Desenhar constitui um ponto de partida muito importante para a escrita composicional. Além disso, os livros que dependem de imagens permitem o acesso ao significado através da sua análise e apoiam as crianças na compreensão da história.

3. Relacionar os livros entre si. Os educadores devem analisar, juntamente com as crianças, as decisões dos autores e ilustradores, e sugerir que tentem fazer o mesmo quando escreverem um livro. Os educadores devem apontar práticas comuns entre os autores e ilustradores, deixando claro que podem aprender uns com os outros. Por exemplo, as crianças podem ser encorajadas a utilizar cores alegres e vibrantes para representar sentimentos de alegria e tons mais escuros para comunicar emoções negativas.

4. Criar espaços para a escrita em grupo. A escrita em grupo constitui uma estratégia promotora da interacção entre os pares e, não menos importante, da aprendizagem colaborativa. Por essa razão, as autoras recomendam que se promovam frequentemente actividades de grupo.

5. Introduzir a escrita de livros de forma estratégica. Para facilitar a compreensão das crianças acerca do conceito de livro e promover a sua motivação e envolvimento em actividades de escrita, os educadores devem encorajá-las gradualmente a escrever. Sugerir livros que permitam a leitura compartilhada, assim como livros escritos por outras crianças, pode esclarecer qualquer dúvida ou confusão sobre o que as crianças podem criar. Além disso, é importante esclarecer as rotinas envolvidas na escrita de um livro, os materiais necessários e o local onde podem ser encontrados.

6. Tornar os livros acessíveis. Durante as actividades de escrita, os livros ilustrados, principalmente os que foram utilizados durante a leitura compartilhada, devem estar num local acessível para que as crianças possam explorá-los e usá-los como inspiração.

7. Participar nas actividades de escrita. Os educadores devem participar nas actividades de escrita. A sua participação, além de permitir observar e identificar as competências e estratégias adoptadas pelas crianças, permite apoiá-las nos processos de tomada de decisão e incentivá-las a escrever. De acordo com Friddle e Ivey (2023), é essencial considerar que a ênfase está na participação dos educadores, não na supervisão. Especificamente, os educadores podem, por exemplo, sentar-se com as crianças e interagir com elas, em vez de apenas observá-las.

8. Promover a ajuda e colaboração entre as crianças. As crianças não aprendem apenas com os educadores, mas também umas com as outras. Por isso, os educadores devem partilhar com o grupo os métodos e estratégias utilizados por cada criança. Assim, as crianças começarão a ver-se umas às outras como recursos e fontes de conhecimento e, igualmente importante, sentir-se-ão valorizadas.


Principais ideias a reter

De acordo com Friddle e Ivey (2023), as crianças podem desenvolver o gosto e interesse pela escrita se os educadores considerarem o que poderá motivá-las e envolvê-las em actividades dessa natureza. Segundo as mesmas investigadoras, a realização de actividades em contexto de turma constitui uma estratégia eficaz de promoção da participação activa das crianças nas tarefas de escrita. Os professores podem fazê-lo a partir das seguintes estratégias:
  • estimular a leitura repetida de livros ilustrados;
  • incluir livros sem palavras;
  • relacionar os livros entre si;
  • criar espaços para a escrita em grupo;
  • introduzir a escrita de livros de forma estratégica;
  • tornar os livros acessíveis;
  • participar nas actividades de escrita;
  • promover a ajuda e colaboração entre as crianças.

Célia OliveiraSoraia Araújo

terça-feira, 7 de maio de 2024

"Se imagina que poderia moldar o seu filho na pessoa que deseja, terá uma batalha difícil"

Ser pai ou mãe não é tarefa fácil. A pressão é muita e acabam por depositar essa pressão nos filhos. Saber que, na educação de uma criança, ninguém começa do zero e o conceito de "tábua rasa" talvez não faça assim tanto sentido pode ser um alívio para muitos pais e uma ajuda na tarefa hercúlea que é a parentalidade, defende a psicóloga norte-americana Danielle Dick

Danielle Dick é psicóloga, investigadora, e há mais de 20 anos que se dedica ao estudo da influência que os genes têm no comportamento, nas adições, na personalidade e na saúde mental. Em 2021, depois da própria experiência de maternidade e de perceber que todos os conselhos que lhe davam pareciam desadequados, escreveu “O Código da Criança”, para ajudar outros pais a perceber a influência da ciência no comportamento dos filhos. É um passo, diz, na luta contra “o ‘mito da parentalidade’ – a ideia de que se apenas lermos o suficiente e fizermos o suficiente, podemos transformar os nossos filhos nos seres humanos que imaginámos.

Em entrevista à CNN Portugal, a especialista defende que “estamos a tornar a parentalidade mais difícil para nós mesmos” e a colocar demasiada pressão sobre os nossos filhos. Danielle Dick sublinha que, na educação dos filhos, os pais importam, mas não têm o controlo sobre tudo. E isso pode ser um alívio para os pais: “Acho um alívio saber que nem tudo está sobre os nossos ombros! Cada decisão nossa não é decisiva! Os nossos filhos são pequenos seres que temos o privilégio de conhecer e de ajudar a moldar a pessoa em que eles se tornam, mas não estamos a começar do zero. Os seus genes também fazem grande parte do trabalho pesado.”

Na mesma conversa, a psicóloga alerta ainda que os pais de hoje são demasiado protetores e, com isso, estão a tirar às crianças a capacidade de resiliência, de resistência e de gestão de conflitos. E diz ainda que, mais do que proibir o uso das tecnologias pelas crianças, é preciso “ajudar os filhos a desenvolver uma relação saudável” com os ecrãs e, sobretudo, “é preciso garantir que os filhos ainda passam tempo pessoalmente com outras crianças e também têm atividades nas quais estão envolvidos que não incluam tecnologia, seja brincar ao ar livre, desporto ou qualquer outra atividade presencial”.

Existem inúmeros livros sobre parentalidade. O que é que torna este livro diferente?

A maioria dos livros e conselhos sobre parentalidade ignora um facto biológico fundamental: o enorme papel que os genes dos nossos filhos desempenham na formação do seu comportamento. Ao compreender a ligação genética única dos nossos filhos, podemos descobrir o que os nossos filhos precisam e que estratégias parentais funcionarão melhor para cada uma das nossas crianças. É isso que “O Código da Criança” ajuda os pais a fazer – compreender as formas como os genes dos nossos filhos moldam o seu crescimento e desenvolvimento, identificar os temperamentos únicos de cada um dos seus filhos e identificar que estratégias funcionarão melhor para crianças com diferentes disposições. Isso não é algo abordado noutros livros sobre parentalidade. Geralmente esses livros concentram-se em dicas e técnicas gerais para os pais. Mas a realidade é que cada um dos nossos filhos é diferente e nem todos respondem da mesma maneira à nossa parentalidade.

O que a motivou a escrevê-lo?

Quando me tornei mãe, comecei a prestar atenção aos principais conselhos parentais e percebi o quanto as mensagens parentais que recebemos do mundo não correspondem à ciência. A nossa sociedade perpetuou o “mito da parentalidade” – a ideia de que se apenas lermos o suficiente e fizermos o suficiente, podemos transformar os nossos filhos nos seres humanos que imaginámos. Mas a ciência não apoia isso. Na verdade, os nossos esforços para cuidar dos nossos filhos podem sair pela culatra, levando-os a sentir maior pressão, a ter taxas mais elevadas de ansiedade e a ter menos capacidade de navegar pelo mundo por si próprios.

Descobri que o meu conhecimento proveniente da investigação – compreender como os genes dos nossos filhos desempenham um papel no seu desenvolvimento e comportamento – foi tremendamente útil na educação dos meus próprios filhos. Mas vi muitos dos meus amigos talentosos e incríveis a duvidarem de si mesmos, perguntando-se o que estavam a fazer de errado ou se havia algo de errado com seus filhos, sempre que os seus filhos não eram a criança perfeitamente comportada que eles imaginavam que criariam. Dei por mim a conversar com os meus amigos sobre a investigação com tanta frequência que finalmente decidi escrever um livro - para que outros pais também pudessem ter o conhecimento necessário para os ajudar na sua criação. E foi isso que me levou a escrever “O Código da Criança”.

Então, vem a pergunta inevitável: de que forma é que, na prática, o facto de eu ter consciência da importância da genética no comportamento e na personalidade dos meus filhos me ajuda a ser melhor mãe?

Como lhe disse, ao ignorar o importante papel que os genes dos nossos filhos desempenham no seu comportamento, estamos a tornar as coisas mais difíceis para nós próprios. Isso leva-nos a colocar muita pressão em todas as nossas decisões diárias como pais. A boa notícia: nem tudo nos cabe a nós e não podemos moldar nossos filhos do zero. Eles já têm, nos seus genes, muito do que precisam para crescer e desenvolver-se.

Talvez ainda mais importante, o facto de todos os nossos filhos terem ligações diferentes com base nos seus códigos genéticos únicos também significa que não existe uma forma “certa” de ser pais. A paternidade de tamanho único não funciona e torna a paternidade mais difícil do que o necessário. Ao reconhecer quem são os nossos filhos por design genético, podemos adaptar a nossa educação às necessidades de cada um dos nossos filhos.

Essa consciência do poder dos genes no comportamento dos nossos filhos não poderá trazer uma espécie de inevitabilidade à parentalidade? Ou seja: o meu filho tem um comportamento desviante ou desafiador ou até mesmo um transtorno de personalidade, mas como a genética o explica não há nada que possa ser feito... Isso não limita a minha atuação como educador e não me fará mesmo renunciar ao meu papel enquanto mãe? Se a genética tem um papel tão relevante, qual é o meu papel como mãe (não perde relevância?)?

Quero ser clara: não estou a dizer que os pais não são importantes. Claro que somos! Estou a dizer que os genes também são importantes. E, ao não levar isso em consideração, estamos a tornar a parentalidade mais difícil para nós mesmos. O facto de os nossos filhos virem ao mundo com cérebros conectados de uma maneira específica e de a sua fiação única desempenhar um papel no desenrolar das suas vidas remove parte do controle que temos como pais. Então, se imaginava que poderia moldar o seu filho exatamente na pessoa que você deseja que ele seja, terá uma batalha difícil.

Mas penso nisso de uma maneira diferente. Acho um alívio saber que nem tudo está sobre os nossos ombros! Cada decisão nossa não é decisiva. Os nossos filhos são pequenos seres que temos o privilégio de conhecer e de ajudar a moldar a pessoa em que eles se tornam, mas não estamos a começar do zero. Os seus genes também fazem grande parte do trabalho pesado. Um dos nossos papéis importantes como pais é ajudar a ajustar a forma como as características dos nossos filhos se revelam. Pense no seu papel enquanto mãe como um botão de rádio: você pode sintonizar para cima ou para baixo certas tendências. Então, por exemplo, se o seu filho é naturalmente predisposto a ser mais introvertido, provavelmente você não irá convertê-lo em alguém que eventualmente adorará dançar em cima da mesa e ser o centro das atenções. Mas você vai poder fazer coisas para ensiná-lo a sentir-se mais confortável em ambientes de grupo e para garantir que não sejam esquecidos na escola.

Se a genética é tão importante para o comportamento e para a personalidade, como podem dois filhos nascidos dos mesmos pais serem tão diferentes?

O facto de duas crianças nascidas dos mesmos pais poderem ser tão diferentes mostra como os genes das crianças são importantes na formação do seu comportamento. Cada criança é uma mistura de 50% do ADN do pai biológico e 50% do ADN da mãe biológica. Mas os 50% que recebem de cada pai é aleatório. Assim, cada irmão recebe uma mistura diferente do ADN dos seus pais biológicos, de modo que todos têm a sua própria composição genética única. É por isso que os irmãos podem ser tão diferentes, mesmo sendo criados na mesma família, pelos mesmos pais. Acho que todos os pais com mais de um filho já tiveram esta experiência: você pensa que está a fazer a “mesma coisa” com seu segundo filho, mas eles respondem de maneira muito diferente!

Se esta componente genética for ignorada, que consequências poderá ter no desenvolvimento das crianças?

Ignorarmos o importante papel dos genes dos nossos filhos no seu comportamento faz com que exerçamos demasiada pressão sobre nós próprios como pais e que coloquemos demasiada pressão sobre os nossos filhos. Por exemplo, se você tem um filho que é naturalmente mais introvertido e está constantemente a dizer-lhe que ele precisa de sair mais, fazer mais amigos, passar menos tempo sozinho, então pode dar-lhe a impressão de que há algo errado com ele ou que ele não é “o que você quer”. Na verdade, até pode ser que você seja um pai mais extrovertido e imagina que eles seriam mais felizes se fossem mais sociáveis. Mas pode não ser assim que o seu cérebro está conectado. Quando ignoramos a forma como cada um dos nossos filhos únicos está programado, perdemos uma oportunidade importante de adaptar a nossa educação ao que funcionará melhor para cada um dos nossos filhos e de desenvolver relacionamentos próximos e significativos que os apreciem pelo que são.

É possível realizar um estudo genético dos nossos filhos e agir medicinalmente ou medicamente para prevenir ou corrigir comportamentos desviantes ou desafiadores?

Existem cientistas como eu que estão a realizar estudos para identificar variantes genéticas específicas (existem milhares delas!) que aumentam o risco de problemas comportamentais e de saúde mental. Não existem atualmente testes genéticos disponíveis para resultados comportamentais complexos, mas os pais não precisam de um teste genético para descobrir a composição genética dos seus filhos. Como pais, muitas vezes, conhecemos os nossos filhos melhor do que ninguém. Descobrir o comportamento natural do seu filho – como o cérebro dele está programado para torná-lo a pessoa única que ele é - exige apenas que você seja um detetive dedicado. A intenção é procurar padrões de comportamento que sejam consistentes ao longo do tempo e das situações. Por exemplo, todas as crianças ficam aborrecidas, especialmente quando estão cansadas ou com fome, mas se você tem um filho que parece ficar constantemente aborrecido, de forma desproporcional, com coisas aparentemente menores - e isso acontece em casa, na escola, enquanto realiza tarefas normais - então o seu filho está predisposto a uma maior emotividade. Mas a boa notícia é que só porque o seu filho tem tendências para comportamentos desafiadores, isso não significa que terá esses desafios para sempre. Isso significa que eles precisam de ajuda extra para aprender a controlar comportamentos e emoções, porque isso não é natural para eles. Os pais podem ajudar com isso! “O Código da Criança” tem questionários para ajudar os pais a descobrir a disposição natural dos próprios filhos. E, depois, analisa o que as crianças com disposições diferentes precisam dos pais e quais as estratégias parentais que funcionam melhor para crianças com disposições diferentes. Isto inclui estratégias para ajudar as crianças com tendências mais desafiantes.

Estamos a atravessar uma verdadeira crise de saúde mental. Nunca se ouviu falar tanto sobre depressão e ansiedade... inclusive em crianças. A genética tem alguma influência nessas questões? Se sim, qual é o papel do ambiente em que vivemos? Que influência tem a guerra, a pandemia ou o uso excessivo de ecrãs e o consumo excessivo de redes sociais, por exemplo?

O comportamento dos nossos filhos é produto tanto dos seus genes como do ambiente. O grande aumento da ansiedade e da depressão nas crianças hoje provavelmente reflete as pressões ambientais. Mas algumas crianças são mais suscetíveis a desenvolver problemas do que outras, o que significa que as crianças que apresentam risco genético têm ainda mais probabilidades de desenvolver problemas quando confrontadas com fatores de stress ambiental.

A nossa forma de gerir a parentalidade, hoje em dia, tem alguma influência neste aumento de casos de problemas de saúde mental?

Pensa-se que uma das condições ambientais que pode estar a contribuir para o aumento das taxas de ansiedade nas crianças está, na verdade, relacionada com a forma como mudámos a nossa parentalidade ao longo da última geração. Os pais de hoje passam mais tempo a supervisionar as atividades dos seus filhos do que nunca. No passado, costumava ser comum enviar crianças para brincar fora de casa sem supervisão. Colocamos mais responsabilidade sobre elas e elas tiveram de aprender a enfrentar os desafios e as relações sociais por conta própria. Hoje, é muito mais comum ter adultos a supervisionar e a gerir constantemente as atividades e o tempo livre das crianças. Embora isto traga alguns benefícios (por exemplo, observamos taxas mais baixas de comportamento de risco em adolescentes), a desvantagem é que isso significa que as crianças não aprendem a interagir sozinhas com os outros, a enfrentar pequenos desafios e a desenvolver resiliência. Estas são habilidades importantes de desenvolvimento. O tempo com os colegas é importante para o desenvolvimento de competências sociais, especialmente à medida que as crianças crescem. Quando os adultos estão constantemente por perto a cuidar de tudo, as crianças não desenvolvem as habilidades de que necessitam, levando a índices mais elevados de ansiedade.

Os nossos filhos também não têm demasiadas atividades? Eles não estão demasiado ocupados?

A resposta a esta pergunta está relacionada com a que lhe dei na questão anterior. As crianças têm tantas atividades programadas e supervisionadas, em grande parte orquestradas por adultos, que não têm a capacidade de aprender a gerir o seu próprio tempo e a navegar pelas situações por conta própria.

Somos a geração de pais mais informada de todos os tempos. Mas talvez também aquela com menos tempo disponível… será que estamos a prestar atenção suficiente aos nossos filhos? Dedicamos-lhes tempo suficiente? Conhecemos realmente os nossos filhos?

Os pais hoje passam mais tempo com os filhos do que qualquer geração anterior. Mas o problema de gastar tanto tempo a tentar moldar os nossos filhos e o seu comportamento e a gerir os seus horários é que isso pode levar a todos os desafios que mencionei acima. E esses desafios passam por demasiada pressão sobre os nossos filhos, demasiada pressão sobre os pais quando os filhos estão com dificuldades e as crianças não têm tempo sozinhas com outras crianças para desenvolver habilidades sociais e resiliência para aprender como navegar pelas situações por conta própria.

As crianças de hoje passam muito tempo ocupadas com ecrãs. Existe mesmo uma tentativa, em muitos países, de digitalizar as tarefas escolares (embora, noutros, já se esteja a assistir a um recuo nestas medidas). Que consequências a exposição excessiva aos ecrãs e a digitalização das tarefas diárias podem ter no desenvolvimento infantil? Que adultos estamos a construir?

Os efeitos a longo prazo da nossa enorme mudança social em direção à tecnologia digital são desconhecidos. Como a maioria das coisas, a tecnologia tem partes boas e outras não tão boas que também lhe estão associadas. Mas, provavelmente, veio para ficar. Por isso, o principal para os pais é ajudar os filhos a desenvolver uma relação saudável com a tecnologia. É preciso garantir que os seus filhos ainda passam tempo com outras crianças e também têm atividades nas quais estão envolvidos que não incluam tecnologia, seja brincar ao ar livre, desporto ou qualquer outra atividade presencial.

Que conselho daria aos pais que atualmente enfrentam dificuldades para ter filhos com problemas comportamentais, de personalidade ou de saúde mental?

Os pais geralmente esperam muito para procurar ajuda quando os seus filhos estão com dificuldades. Uma das perguntas que os pais me fazem frequentemente é: “O comportamento do meu filho é normal?”. Essa é a pergunta errada a fazer. Como o comportamento infantil segue uma curva em forma de sino (o que significa que é normal ter algumas crianças com comportamento muito alto ou muito baixo), devemos pensar é se o comportamento está a interferir na vida da criança, se está a prejudicar o relacionamento deles consigo, se está a interferir nas relações positivas com os colegas ou a causar problemas na escola. Se a resposta a alguma dessas perguntas for sim, é sempre uma boa ideia procurar a ajuda de um profissional de saúde mental.

As pessoas que conheço que têm maior probabilidade de procurar ajuda para seus filhos são colegas psicólogos infantis e psiquiatras. Percebemos que criar os filhos é difícil, especialmente quando eles estão a passar por dificuldades, e precisamos de toda a ajuda que pudermos obter. Há um capítulo inteiro no meu livro dedicado a ajudar os pais a saber quando procurar ajuda e por onde começar a procurá-la.

Fonte: CNN Portugal por indicação de Livresco

segunda-feira, 6 de maio de 2024

Seminário “Inclusão em Movimento: Desporto Adaptado e Atividade Física para Todos”



No ano em que Viseu é Cidade Europeia do Desporto 2024 (Viseu CED24), a Invictus Viseu – Associação Desportiva, Recreativa e Cultural e a Escola Superior de Educação de Viseu (ESEV) – Departamento de Ciências do Desporto e Motricidade, fruto do sucesso verificado na 1ª edição (2023), voltam a organizar conjuntamente, a 2ª Edição do Seminário “Inclusão em Movimento: Desporto Adaptado e Atividade Física para Todos”.

O evento decorrerá nos dias 24 e 25 de maio de 2024, decorrendo no dia 24 de maio no Auditório da Escola Superior de Tecnologia e Gestão de Viseu (ESTGV) e no dia 25 de maio de 2024 no Pavilhão Desportivo do IPV, ambos os espaços situados no Campus do Instituto Politécnico de Viseu (IPV).

Este seminário tem como objetivo abordar diversas temáticas, a serem apresentadas por personalidades de reconhecido prestígio e experiência profissional tanto a nível nacional quanto internacional na área do desporto e da atividade física adaptados. Espera-se que tais contribuições possam enriquecer de maneira significativa a atual linha de ação, que nos últimos vinte anos se tem orientado para uma política social voltada para a valorização da diversidade, da inclusão e o combate à exclusão. Através da realização da segunda edição deste seminário, pretendemos fomentar a continuidade da elaboração de políticas que promovam a igualdade de oportunidades no âmbito desportivo, educativo, social e profissional, nos serviços disponibilizados pela sociedade ou que possam ser instituídos para esta população. É imperativo que tais políticas sejam concebidas de modo a garantir que as respostas oferecidas atendam e se adequem às diferentes e específicas necessidades de cada indivíduo, com o objetivo de impulsionar a sua plena inclusão e promover um índice de felicidade favorável associado a esse processo.

Saiba mais informações e como se inscrever AQUI

Fonte: INR

sábado, 4 de maio de 2024

Cinco práticas do ensino da Matemática validadas pela Ciência: Foco em Problemas de Palavras


Prática #5: Foco em Problemas de Palavras
Que prática é esta?

Os problemas de palavras baseiam-se em textos que os alunos resolvem para testar os seus conhecimentos de matemática. Podem ser particularmente complicados devido às inúmeras capacidades que requerem por parte dos alunos. Por exemplo, o êxito na resolução de problemas de palavras envolve:
  • ler um problema;
  • perceber o vocabulário;
  • perceber o conteúdo;
  • identificar um plano para resolver o problema;
  • identificar a informação relevante e ignorar a informação irrelevante;
  • ter um bom desempenho aritmético; e
  • verificar se a lógica está certa.
Quando os resolvem, os alunos aprendem a pôr em prática os princípios de matemática e tentam resolver problemas cada vez mais complexos. Além disso, de acordo com uma investigação de Kenneth R. Koedinger e Mitchell J. Nathan (2004), através da associação de conceitos matemáticos a um contexto de problemas de palavras, os alunos sentem-se incentivados a usar e adaptar estratégias de forma mais flexível para alcançar uma solução «correta».

Em que consiste a investigação?

Vários professores ensinam problemas de palavras definindo a sua modelação matemática (por exemplo, problemas de adição) e associando palavras-chave (por exemplo, em conjunto significa adição) a operações específicas. Como evidenciam os estudos de Karen S. Karp, Sarah B. Bush e Barbara J. Dougherty (2019), ou de Sarah R. Powell e Lynn S. Fuchs (2018), normalmente, estas estratégias não incentivam um pensamento matemático e originam uma resposta errada. Por exemplo, os alunos normalmente aprendem que a expressão em conjunto significa adicionar. Isto, no entanto, nem sempre é verdade.
  • Temos este exemplo: «A Alice comprou três sacos com mercearias. Cada saco custa 15 €. Quanto dinheiro é que a Alice gastou em conjunto?» 
Neste exemplo, os alunos não devem adicionar 3 e 15, mas sim multiplicar os dois números para obter o produto.

Esta regra não se aplica só à expressão em conjunto, mas também a termos como mais, menos, resto, cada, dobro, partilhar e dividir. De acordo com uma investigação de Sarah R. Powell, Jessica M. Namkung e Xin Lin (2022), na verdade, analisando a frequência com que as palavras-chave associadas a operações ajudam os alunos a resolver um problema de palavras corretamente, verifica-se que esta corresponde a menos de 10% dos problemas de palavras com vários passos.

Para ajudar, existem várias abordagens para a resolução destes problemas que têm uma base de investigação forte: o uso de uma estratégia de ataque e um foco em esquemas de resolução. Independentemente do tipo de problema de palavras, os alunos precisam de uma estratégia de ataque. Esta consiste numa série de passos fáceis de recordar que os alunos usam para definir a sua abordagem de resolução de problemas de palavras. Décadas de investigação educativa comprovaram que o uso de uma estratégia de ataque é eficaz para melhorar o desempenho de resolução de problemas de palavras — destacam-se, por exemplo, os trabalhos coordenados por Shaqwana M. Freeman-Green (2015), Jennifer Krawec (2012) ou Yan Ping Xin e Dake Zhang (2009).

Estas estratégias são essenciais para a resolução das principais componentes e de todos os passos do problema de palavras, e usam normalmente acrónimos para ajudar os alunos a recordar as componentes da resolução. Apesar de os acrónimos poderem ajudar os alunos a recordá-las, os professores precisam de ensinar cada componente do acrónimo e certificar-se de que a estratégia se usa de forma continuada.

Outra abordagem para a resolução destes problemas, que normalmente se usa em conjunto com uma estratégia de ataque, é um foco em esquemas. Um esquema é a estrutura essencial de um problema de palavras e normalmente tem como base o(s) conceito(s) salientados na pergunta. Quando os alunos reconhecem o esquema e têm uma estratégia para a resolução com esse esquema, torna-se mais fácil resolvê-lo. O ensino de esquemas é uma prática recomendada pela investigação para vários alunos.

Como é que isto funciona em sala de aula?

Independentemente da estratégia de ataque usada, esta deve ser claramente modelada e os alunos devem ter várias oportunidades de a praticar para verem como pode ser útil. Isto pode relacionar-se com técnicas de pensamento em voz alta (ver a prática #3), de foco no vocabulário (ver a prática #1) e com o uso de representações (ver a prática #2), para ajudar os alunos a perceberem o significado de diferentes problemas de palavras. O principal objetivo é a estratégia de ataque tornar-se natural para ser usada pelos alunos com fluência.

Em problemas de palavras no ensino básico surge normalmente seis esquemas (ver a figura 1). Nos primeiros anos deste nível de ensino, os alunos resolvem problemas aditivos (ou seja, usam a adição ou a subtração para a resolução). Existem três esquemas aditivos comuns: total, diferença e troco (ver a figura 1).

Figura 1. Esquemas de problemas de palavras

No esquema total, as partes são reunidas num total (por exemplo, P1 + P2 = T, onde P1 é parte 1, P2 é parte 2 e T é o total).
  • Por exemplo: «O Manuel ganhou 45 € no sábado e 72 € no domingo. Quanto dinheiro ganhou o Manuel?»
Neste problema de palavras, os alunos têm acesso a duas partes (45 € e 72 €) e têm de encontrar o total. Estes problemas também se podem apresentar com um total, e aos alunos cabe determinar uma parte:
  • Por exemplo: «O Manuel ganhou 117 € no fim de semana. Se ganhou 45 € no sábado, quanto é que ganhou no domingo?»
Muitos problemas têm mais do que duas partes (por exemplo, três partes e um total, ou quatro partes e um total).

O próximo tipo de esquema denomina-se diferença ou esquema de comparação. Aqui, comparam-se os montantes superior e inferior para obter a diferença (por exemplo, G – L = D, onde G é o montante superior, L é o montante inferior e D é a diferença). No problema da diferença na figura 1, os alunos comparam as 3721 canções da Simone com as 4028 canções da Maria para determinarem a diferença. Também é possível escrever problemas de diferenças nos quais os alunos têm de identificar o montante superior desconhecido ou o montante inferior desconhecido.

Outro esquema de problemas de palavras aditivo comum é o de troco. Neste caso, os alunos trabalham com um montante que aumenta ou diminui (por exemplo, S ± C = E, onde S é o montante inicial, C é o montante de troco e E é o montante final). Tais problemas têm um aumento enquanto outros têm uma diminuição (como o problema de troco na figura 1). É importante notar que muitos deles têm um montante de início com dois trocos, e isto é particularmente verdade nos últimos anos do ensino básico e no ensino secundário.

Quando os alunos transitam para os últimos anos do ensino básico, prevalecem três esquemas de multiplicação. Com estes esquemas, os alunos podem multiplicar ou dividir para resolver os problemas. Existem três esquemas de multiplicação comuns: grupos iguais, comparação e combinações.

Em problemas de grupos iguais, multiplicam-se os grupos pelo número em cada grupo para obter um produto (por exemplo, G × N = P, onde G representa grupos, N é número em cada grupo e P é produto).Por exemplo: «A Rita comprou 6 caixas de lápis de cera com 24 lápis de cera em cada caixa. Quantos lápis de cera tem a Rita?»

Neste exemplo, existem 6 grupos (G) com 24 em cada grupo (N). Como acontece noutros esquemas, o desconhecido podem ser os grupos, o número em cada grupo ou o produto.

No esquema de comparação, multiplica-se um conjunto por um número de vezes para se obter um produto (por exemplo, S × T = P, onde S significa conjunto, T é número de vezes e P é o produto). No problema na figura 1, o conjunto é ½ e o número de vezes é 6. Normalmente, com problemas de comparação, o desconhecido é o produto.

Outro exemplo de multiplicação é o esquema de combinações. Neste caso, os alunos identificam todas as possíveis combinações com dois conjuntos (S1 × S2 = P, onde S1 é o primeiro conjunto, S2 é o segundo e P é o produto). No problema sobre a Carolina (ver figura 1), ela conseguiu criar 15 combinações de roupa diferentes com três pares de calças e cinco camisolas. Segundo duas investigações coordenadas por Asha K. Jitendra (2009 e 2013), à medida que os alunos transitam para os últimos anos do ensino básico ou para os primeiros anos do ensino secundário, começam a tentar resolver problemas de palavras relacionados com razões e proporções, que muitas vezes se consideram esquemas adicionais.

Conclusão

Em todos os esquemas, os professores devem usar um método de ensino explícito e dar tempo para praticar e resolver problemas. Segundo um estudo de Sarah R. Powell e Lynn S. Fuchs (2018), normalmente é uma vantagem criar e pôr em prática um esquema para várias aulas ou semanas antes de introduzir um novo. À medida que os alunos aprendem novos esquemas, devem participar em atividades onde seja posta em prática a distinção entre esquemas (por exemplo: «Este é um problema de diferença, e eu sei disso porque o problema pede uma comparação entre dois montantes»).

Este texto é uma adaptação da quinta prática do artigo «Maths Practices You Can Count On: Five Research-Validated Practices in Mathematics», disponível aqui. Esta adaptação resulta de uma parceria editorial com o Centre for Independent Studies (CIS).

quinta-feira, 2 de maio de 2024

Uma em cada 100 crianças em idade escolar tem autismo

Professores e técnicos especializados nas escolas têm um papel fundamental na educação de crianças com autismo. Estimativas em Portugal apontam para 1% de incidência de autismo nas crianças em idade escolar. Há escolas com as valências necessárias, mas a maioria sofre com falta de recursos humanos.

Joana (nome fictício), 6 anos, aluna do 1.º ano do colégio Efanor, em Matosinhos, não fala, mas consegue comunicar com colegas e professores através da comunicação aumentativa, usando símbolos, que tanto servem para indicar que precisa de algo, como para explicar o que sente ou que quer que se faça num determinado momento da aula. Na sala, para além da professora titular, Joana conta com uma tutora e com o apoio dos outros colegas de turma que não a veem como uma criança diferente. “Somos todos iguais e todos diferentes. Por exemplo, eu tenho óculos e o meu amigo não tem. Eu tenho o cabelo comprido e a minha amiga não tem”, explicou uma das alunas numa aula onde o DN esteve presente.

Nessa mesma aula, o grupo recebeu a visita da psicóloga Patrícia Barros, responsável por implementar estratégias para que a inclusão da pequena Joana seja feita de uma forma tranquila e eficaz. Gwen Vieira, a professora titular, sublinha a importância do papel dos terapeutas e das outras crianças na vida de Joana. “Todos usamos os mesmos símbolos e estamos a desenvolver a comunicação aumentativa. A ideia é que todas as crianças tenham a mesma simbologia para que possam comunicar”, explica. A docente garante que Joana é uma menina feliz, está perfeitamente integrada na turma e que “todos a aceitam bem, brincam juntos nos intervalos e procuram-na muito”. Essa integração, garante, é benéfica não apenas para Joana, mas “para todas as crianças da turma”. “O contacto com as diferenças mais acentuadas também leva os mais pequenos a incentivar a restante comunidade escolar para a aceitação, a empatia e a tolerância”, conclui.

Para além da psicóloga que visita a turma, há toda uma equipa multidisciplinar que acompanha a aluna, composta por uma professora de Educação Especial, uma terapeuta da fala e uma tutora. Essas equipas multidisciplinares fazem parte da maioria das escolas públicas e privadas.

Os dados mais recentes divulgados pela Organização Mundial de Saúde (OMS) referem que uma em cada 100 crianças em idade escolar tem Perturbação do Espetro do Autismo (PEA). Uma realidade que não é diferente em Portugal, embora o último estudo feito no nosso país date de 2005. Ao DN, Fernando Campilho, presidente da Federação Portuguesa de Autismo (FPA), diz estimar que 1 por cento das crianças em Portugal sofram de PEA. “Em Portugal não há números fiáveis, mas nós estamos a recorrer aos números internacionais. Por exemplo, há um estudo científico americano que concluiu 1 em cada 36 crianças tem espetro do autismo. Nós estimamos que, em Portugal, seja de 1 por cento, ou seja, 1 em cada 100”, sublinha.

Segundo o Governo, no início deste ano letivo estavam matriculadas em Portugal 1,3 milhões de crianças e jovens no ensino básico e secundário, no ensino público e privado – se 1% tiver espetro do autismo, falamos de 13 mil alunos.

Com o último estudo com dados desatualizados, o responsável salienta a necessidade de voltar a analisar a realidade portuguesa. “Um novo estudo deveria ser feito, mas ter um estudo sério não é barato, nem fácil. A verdade é que os casos têm aumentado ao longo dos últimos 30 anos e era necessário conhecermos a nossa realidade para desenvolvermos um trabalho mais eficaz”, lamenta.

E é devido ao aumento de casos de PEA que o papel dos terapeutas e do acompanhamento em ambiente escolar ganha cada vez mais importância.

“É essencial o papel do terapeuta. Não apenas de um profissional, uma vez que nenhuma intervenção que vá abordar uma área isolada do desenvolvimento vai atingir as questões do Autismo. Apesar do Autismo envolver áreas centrais como a interação e a comunicação social, há um conjunto de campos do desenvolvimento implicado primária ou secundariamente, como as questões sensoriais, motoras, atencionais, cognitivas e emocionais”, explica Patrícia Barros. A psicóloga salienta ainda a necessidade de intervenção precoce, envolvendo o trabalho transdisciplinar. “Esse trabalho, que integra numa mesma intervenção diversos olhares que se entrelaçam, favorece o desenvolvimento da criança de forma holística, integrando diversas áreas do desenvolvimento no espaço escolar”, refere.

As crianças com PEA têm necessidades diferentes, pois os graus de autismo podem ir de leve a grave, necessitando de diferentes tipos de intervenção. No caso de Joana, o papel da terapeuta da fala é essencial para o seu desenvolvimento, como explica Mariana Dias, a profissional que a acompanha. “As crianças com Perturbação do Espetro do Autismo apresentam dificuldades persistentes nos pilares da comunicação, especialmente aqueles relacionados com a interação social. Estas dificuldades incluem competências limitadas na integração da comunicação verbal e não-verbal, ao nível do contacto visual, estabelecimento de atenção conjunta, trocas de turnos e funções comunicativas, expressões faciais, gestos como suporte para a comunicação, alterações na prosódia e ainda impasses no planeamento motor para a produção de sons da fala”, revela. A terapeuta salienta que “estas dificuldades comunicativas trazem implicações para a compreensão e expressão da linguagem”. “É importante ressaltar que o nível de competência comunicativa alcançado pelas crianças com PEA é um dos principais preditores para um bom prognóstico a médio e longo prazo”, alerta.

Já Telma Pereira, tutora e assistente terapêutica de Joana, é quem mais tempo passa com a criança em sala de aula, estando presente na quase totalidade das atividades letivas. Questionada pelo DN se esse apoio deveria ser realizado em todas as escolas, a profissional revela poder não ser necessário em todos os casos. “Acredito que seria redutor ter um sistema de apoio universal para todas as crianças autistas. As necessidades e características individuais variam muito dentro do espetro do autismo, por isso, esta intervenção deverá ser fundamentada por uma avaliação profissional rigorosa. Assim, o meu papel enquanto assistente terapêutica é personalizado para a aluna, tendo em conta as suas necessidades específicas. Sou a responsável pela prática das estratégias e adaptações curriculares dentro dos espaços da escola”, adianta.

Contudo, embora a metodologia se deva adaptar caso a caso, Telma Pereira defende o direito de todas as crianças “a um ensino de qualidade e apoios individualizados, que não só os ajudem a alcançar o seu pleno potencial, mas também respeitem as suas singularidades.

Baixos níveis de literacia da comunidade escolar são um entrave

Telma Pereira, tutora e assistente terapêutica, enfrenta muitos desafios no acompanhamento de crianças diagnosticadas com PEA. Um deles é o “baixo nível de literacia da comunidade escolar, em relação ao autismo”. “Isso faz com que sejam colocados desafios a estas crianças, que ultrapassam ou até minimizam as suas capacidades. Por exemplo, não se pediria a alguém que utiliza cadeira de rodas para correr. No entanto, como o autismo apresenta características diversificadas e, em alguns casos, não tão evidenciadas, estas crianças deparam-se com demandas muitas vezes desalinhadas com as suas características”, esclarece. Segundo a terapeuta, quem lida com crianças com PEA, “quando as exigências são desproporcionais, a resposta também é menos consistente e, portanto, pode haver frustração por parte do profissional”. “Por essa razão, é fundamental não apenas ter um profissional individualizado, mas também um professor de classe que seja preparado e formado para identificar com clareza e agir consoante os diversos perfis das crianças autistas”, afirma. Telma Pereira apresenta ainda a realidade das escolas, onde “é cada vez maior a quantidade de crianças autistas em sala de aulas e mais complexo o desafio da inclusão”.

“Acreditamos que só um esforço conjunto e o conhecimento aprofundado das características e técnicas de intervenção podem ampliar o desenvolvimento dessas crianças bem como melhorar a qualidade do trabalho e o bem-estar também dos professores”, diz.

Segundo a terapeuta, outro dos desafios reside “na verdadeira inclusão da criança, indo além da sua presença nas atividades escolares e facilitando a sua real participação nas mesmas”. E para que se possa potenciar uma evolução na qualidade de vida das crianças, frisa, “é fundamental fazer transformações e acomodações para criar um ambiente de plena inclusão”.

“Escola de afetos” é um caso de sucesso

Uma sala livre de estímulos excessivos que possam sobrecarregar os sentidos das crianças com autismo, um espaço com cores suaves e iluminação adequada, um ambiente dividido em zonas específicas para diferentes tipos de atividades, com áreas de jogo sensorial, áreas de relaxamento, áreas de aprendizagem e áreas de comunicação, uma variedade de recursos, como almofadas de texturas diferentes, zonas de autorregulação para acalmar as crianças – com baloiços que simulam ninhos –, brinquedos sensoriais e materiais táteis. Este é o espaço criado de raiz pela Equipa Multidisciplinar de Apoio à Educação Inclusiva (EMAEI), em setembro de 2023, no Agrupamento de Escolas Eugénio de Andrade, no Porto. A valência conta ainda com quadros de rotina, calendários visuais, cartões de comunicação e etiquetas com imagens para facilitar a compreensão e até uma cozinha adaptada. As crianças do agrupamento contam ainda com cinoterapia (uma atividade que utiliza o cão como facilitador no processo terapêutico), musicoterapia e atividades lúdicas adaptadas.

Tudo foi pensado ao pormenor por Sónia Cruzeiro, coordenadora da EMAEI. Um sonho tornado realidade depois de três anos de aumento sucessivo de matrículas de alunos com PEA e uma vontade de fazer mais pelas crianças do agrupamento. “Esta valência era um sonho para mim porque considerava que esta era a resposta necessária e adequada para as crianças”, conta emocionada, ao DN, Sónia Cruzeiro. A luta da coordenadora surtiu efeito, conseguindo a aprovação do Ministério da Educação e o apoio da Câmara Municipal do Porto. O agrupamento que era já uma referência na educação bilíngue para alunos surdos viu assim nascer uma valência onde há todos os recursos para potenciar as capacidades das crianças, embora Sónia Cruzeiro queira mais. “Custa-me dizer que não tenho vagas quando os pais nos procuram e estão emocionalmente frágeis”, confessa.

Nos últimos anos, conta, a escola registou um acréscimo acentuado de crianças com PEA e os pedidos de inscrições e de reuniões com pais fazem antever o mesmo cenário para o próximo ano letivo. “Já fiz quatro reuniões com pais que querem inscrever os filhos na escola, pois sabem que aqui temos as melhores condições para os receber”, revela. Sónia Cruzeiro quer, por isso, fazer crescer a valência para “conseguir dar resposta a todos”. “O nosso sonho é conseguir alargar aos outros ciclos, pois neste momento estamos a trabalhar apenas com crianças do 1.º. Queremos alargar e replicar o que estamos a fazer”, afirma.

A equipa é composta por duas professoras de educação especial, duas terapeutas da fala, uma terapeuta ocupacional, um professor de educação física adaptada e um intérprete de Língua Gestual Portuguesa. Uma equipa alargada de especialistas para apoiar as 22 crianças do agrupamento.

Contudo, o propósito não é manter os alunos confinados no mesmo espaço. “O objetivo não é tirá-los das salas de aula, mas ter este apoio num espaço próprio onde possam potenciar as suas capacidades”, conta. Uma estratégia que tem surtido efeito nos poucos meses de existência da valência. A articulação entre a equipa da EMAEI e os professores titulares das turmas em que as crianças estão inseridas permite dar continuidade ao trabalho da equipa em sala de aula. E as crianças, garante Sónia Cruzeiro, são felizes. “O mais gratificante é ver a alegria com que chegam à escola e a tranquilidade dos pais quando nos entregam os filhos. Há pequenas conquistas a cada semana que passa”, acrescenta Carolina Ribeiro, terapeuta da fala. Conhecida como “uma escola de afetos”, Sónia Cruzeiro defende que a disponibilidade emocional e o trabalho com amor que a equipa realiza na instituição de ensino é o segredo para que as crianças com PEA sejam felizes e para que possam vir a ser cidadãos autónomos.

Faltam recursos para alunos do Ensino Especial

Os casos de sucesso das escolas visitadas pelo DN não refletem a realidade da maior das instituições de ensino em Portugal. A Federação Nacional dos Professores levou a cabo um estudo, no decorrer do 1.º período, num universo que corresponde a 10% dos agrupamentos de escolas e escolas não agrupadas do continente, questionando os diretores escolares sobre a Educação Inclusiva. O resultado mostrou que 83% dos diretores dos agrupamentos de escolas (AE) e das escolas não agrupadas (ENA) afirmaram não ter os recursos necessários para uma “educação verdadeiramente inclusiva”. Filinto Lima, presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas, tem alertado sucessivamente para essa problemática, afirmando que “a educação inclusiva é o parente pobre da educação” e pedindo mais investimento em recursos humanos e na formação dos assistentes operacionais.

Como explicar o aumento de casos

Patrícia Barros, especializada em problemas de desenvolvimento de crianças e adolescentes e investigadora na Universidade do Minho, apresenta várias justificações para o aumento da incidência de PEA, mas admite não haver uma resposta unânime sobre o tema. “Existem algumas possíveis hipóteses, como os avanços na expansão da informação e do diagnóstico do autismo, especialmente os níveis mais subtis, questões genéticas e epigenéticas, variáveis ambientais durante a gravidez e parto como o sofrimento fetal, por exemplo. O Autismo é multifatorial, apesar de se saber que há uma grande participação genética”, explica. Já Fernando Campilho, presidente da FPA, acredita que o aumento da incidência de casos passe pela alteração dos critérios de diagnósticos e por “uma maior atenção por parte das famílias”.

Fonte: DN

quarta-feira, 1 de maio de 2024

Este curso grátis de português para estrangeiros é uma visita virtual pelo Porto

A Universidade do Porto vai ter um curso online que propõe dar a conhecer a língua portuguesa a partir de uma viagem virtual pelo "coração" do Porto, Património da Humanidade.

Para tal, estão convocados "todos os que queiram aprender a comunicar e a interagir em português europeu em situações básicas do quotidiano", por exemplo, apresentar-se e apresentar alguém, obter e dar informações, comprar um bilhete, ir ao café ou ao restaurante, fazer compras, fazer uma reserva ou ocupar os tempos livres.

O curso é oferecido pela Faculdade de Letras (FLUP) e pela Unidade de Inovação Educativa (IE) da Universidade do Porto a todos os que queiram conhecer a língua, nomeadamente a estudantes que se preparam para vir em Erasmus, desde que se inscrevam, também de forma gratuita, na página do curso na plataforma de educação edX.

"Não é necessário possuir conhecimentos prévios de português", uma vez que se trata de um curso de iniciação à Língua.

Com um tempo estimado de dedicação e estudo de 32 horas, o itinerário de aprendizagem do curso baseia-se numa série de ficção constituída por oito episódios/módulos semanais, protagonizados por actores profissionais, em espaços típicos da cidade do Porto.

De acordo com a fonte, além de aprenderem português, os participantes têm também a oportunidade de conhecer o modo de vida dos portuenses, contando para isso com o apoio uma equipa de professores "com larga experiência" no ensino de Português Língua Estrangeira.

Neste curso, "propomos uma viagem ao Porto, uma das mais bonitas e características cidades de Portugal, para que possa conhecer a língua portuguesa e uma parte dessa riqueza cultural, com uma equipa de professores muito empenhados e com grande experiência no ensino do português", liderados pelas professoras universitárias Fátima Silva e Ana Isabel Fernandes.

O objectivo é que no final desta acção de formação os alunos sejam capazes de apresentar-se e apresentar os outros, fazer perguntas e dar respostas sobre informações pessoais (nacionalidade, lugar onde vive, línguas faladas, profissão), estabelecer contactos sociais usando adequadamente formas de saudação, apresentação e despedida e de comunicar de forma simples para satisfazer necessidades comunicativas básicas no quotidiano, nomeadamente ir ao café e ao restaurante, comprar bilhetes, fazer compras, pedir informações ou deslocar-se na cidade.

Para tal, serão ensinados a pronunciar, de forma isolada, a maior parte dos sons da língua portuguesa, e, em contexto, dizer palavras, frases e pequenos textos, usar um repertório básico de vocabulário relacionado com a vida quotidiana e utilizar estruturas linguísticas elementares.

Fonte: Público de acesso livre

segunda-feira, 29 de abril de 2024

Estudo sobre a Implementação e o Impacto dos Planos de Ação de Desenvolvimento Digital das Escolas (PADDE) - Relatório final



A Direção-Geral da Educação divulga o Estudo sobre a Implementação e Impacto dos Planos de Ação de Desenvolvimento Digital das Escolas (PADDE), desenvolvido pelo Centro de Investigação e Estudos em Sociologia (CIES), do Iscte-Instituto Universitário de Lisboa. Com este Estudo, pretendeu-se analisar o potencial transformador do desenvolvimento tecnológico no sistema educativo e da aplicação transversal do digital nas escolas, a partir da implementação do PADDE, no que se refere às dimensões organizacional e pedagógica.

A informação obtida permite conhecer, em maior profundidade, como têm vindo a ser implementados os PADDE nos diversos AE/Ena de Portugal Continental e qual o impacto dos mesmos nos seus contextos.

Fonte: ERTE por indicação de Livresco

sábado, 27 de abril de 2024

Cinco práticas do ensino da Matemática validadas pela Ciência: Desenvolver Fluência

Prática #4: Desenvolver Fluência

Que prática é esta?

Fluência, em termos práticos, é fazer exercícios de matemática com facilidade e exatidão. A fluência de factos e de cálculos desenvolve-se através da associação de números, aprendizagem de conceitos, pensamento estratégico e resolução de problemas. A fluência é importante em matemática porque os alunos podem dar uso ao conteúdo memorizado para resolver problemas mais complexos e com vários passos. Segundo um estudo do National Council of Teachers of Mathematics (NCTM), de 2023, a fluência de cálculos é evidente quando os alunos conseguem mostrar flexibilidade nos métodos escolhidos, perceber e explicá-los, e produzir respostas corretas de forma eficaz.

Em que consiste a investigação?

A fluência é muitas vezes mal interpretada como sendo a capacidade de calcular rapidamente factos matemáticos, independentemente da compreensão conceitual (por exemplo, memorização). Mas a fluência é muito mais do que a memorização de factos de matemática. Os professores pretendem que os alunos desenvolvam a fluência (ou seja, facilidade e exatidão) com contagens, comparação, frações, geometria, análise de dados, medição e álgebra, entre outros tópicos. Quando os alunos são fluentes num aspeto de conhecimento de base da matemática, essa informação associa-se a um melhor desempenho posterior nesta área. Por exemplo, uma investigação liderada por Paul T. Cirino, de 2016, provou que é possível prever resultados de cálculos de computação a partir do desempenho de factos matemáticos. Noutros estudos, como os coordenados por David C. Geary, em 2015, e Robert S. Siegler, em 2012, os investigadores identificaram capacidades para realizar operações importantes em matemática mais avançada, como frações ou álgebra. Segundo um trabalho coordenado por Matthew K. Burns, em 2015, vários alunos podem atingir fluência à medida que vão praticando, mas alguns precisam de mais oportunidades para atingir o mesmo nível de proficiência.

Os factos de matemática são abordados no ensino básico e abrangem adição (por exemplo, 4 + 3, 9 + 7), subtração (6 – 2,14 – 8), multiplicação (4 × 8) e divisão (72 ÷ 9). Para serem bem-sucedidos neste campo, os alunos precisam de provar que atingiram um nível de proficiência com capacidades prévias de contagens, conhecimento de números e perceção do que os números representam. A recuperação de factos de matemática é essencial para a abordagem de conceitos mais complexos e, por isso, os professores devem incorporar atividades de desenvolvimento de fluência no âmbito e na sequência das aulas diárias. Uma investigação coordenada por Lynn S. Fuchs, em 2021, recomenda a inclusão regular de atividades cronometradas para desenvolver a fluência dos alunos. Esta estratégia deve ser usada em tópicos de matemática que o aluno já estudou anteriormente e aumentar em complexidade ao longo do programa. Apesar de esta estratégia poder incluir fluência de factos de matemática com conhecimentos de base (por exemplo, 4 + 5), também pode incluir outros conceitos, como frações, estimativas ou notação posicional.

A fluência pode ainda apoiar-se no uso de estratégias eficazes e no acompanhamento do progresso dos alunos. Os alunos devem continuar a usar as estratégias anteriormente aprendidas. Uma dessas estratégias inclui a «contagem a partir de», descrita num estudo coordenado por Sarah R. Powell, em 2023, na qual o aluno começa com o maior número e continua a contar as outras paralelas para obter a soma. A figura 1 mostra o exemplo 4 + 3. O aluno começa com o número 4 como o maior e conta mais três (por exemplo, 4… 5, 6, 7) para chegar à soma de 7. A mesma metodologia pode ser aplicada à subtração, onde o aluno começa com o subtrativo e «continua a contar» até ao aditivo. No exemplo, em 10 – 4, o aluno começa no número 4 e conta até 10 para obter a diferença 6.

Figura 1. Exemplo da estratégia «contagem a partir de»


A fluência em conjunto com o acompanhamento do progresso pode incentivar os alunos a manterem o foco e a motivação. Nesta estratégia, os alunos registam os resultados ao longo do tempo numa tabela ou num gráfico. São definidos objetivos ambiciosos, mas realistas, e os estudantes têm o incentivo de tentar alcançar esses objetivos.

O progresso pode ser acompanhado individualmente ou em grupo, dependendo das necessidades ou do tipo de ensino.

Como é que esta prática funciona em sala de aula?

Neste campo, focamo-nos em atividades rápidas e diárias criadas para o desenvolvimento de factos de matemática e fluência de cálculos. De acordo com uma investigação coordenada por Lynn S. Fuchs, em 2010, o uso de cartões didáticos com incidência numa capacidade pode ser uma estratégia eficaz para desenvolver fluência. Como mencionado anteriormente, estas capacidades podem ser tão simples como factos de matemática associados a conhecimentos de base. A figura 2 mostra um exemplo de adição com cartões didáticos. Os alunos têm um minuto para responder ao máximo de cartões possíveis. Quando o minuto passar, conta-se os cartões com respostas corretas e depois os estudantes têm mais um minuto para tentar obter um melhor resultado. Quando o segundo minuto passar, os alunos registam o seu melhor resultado no respetivo gráfico.

Figura 2. Exemplo de adição com cartões didáticos


Os alunos também podem realizar atividades através do uso de cartões didáticos com conceitos de matemática mais complexos, como a adição de frações ou as estimativas. Como exemplo, a figura 3 mostra uma atividade com cartões didáticos na qual os alunos têm de identificar a fração mostrada em cada cartão. Os professores são flexíveis em relação à forma como os alunos respondem a estas ferramentas. Os alunos podem responder em conjunto, através do uso de um quadro branco ou de gestos, ou individualmente. É importante que os professores se certifiquem de que os alunos têm tempo para debater as respostas, corrigir e explicar quaisquer falhas.

Figura 3. Exemplo de uma atividade com cartões didáticos


Outra estratégia a aplicar com base nos estudos de investigação, como referido num trabalho coordenado por Robin S. Codding, de 2011, para desenvolver fluência de factos é a de Cobrir, Copiar, Comparar. Nesta abordagem, os alunos veem um problema de matemática resolvido, cobrem o problema, copiam-no e depois resolvem-no e comparam a solução com o problema original. Normalmente, os professores criam uma folha com até 10 problemas associados à mesma capacidade e dão aos alunos 2 a 4 minutos para terminarem a atividade. A figura 4 mostra um exemplo desta estratégia.

Figura 4. Exemplo da estratégia «cobrir, copiar e comparar»

Conclusão

Para obter uma fluência de factos e de cálculos, a vertente prática do ensino é essencial. Os alunos devem praticar um pouco todos os dias. Esta prática é possível através da realização de jogos ou atividades. Tendo em conta os jogos a realizar na vertente prática, uma investigação coordenada por James Russo, de 2018, sugere que estes devem motivar os alunos, representar um equilíbrio entre capacidade e sorte, salientar a matemática, permitir a diferenciação e associar a matemática estudada na escola e a usada em casa. Praticar com colegas ou através de tecnologia também pode ser útil para exercitar a fluência.

Este texto é uma adaptação da quarta prática do artigo «Maths Practices You Can Count On: Five Research-Validated Practices in Mathematics», disponível aqui. Esta adaptação resulta de uma parceria editorial com o Centre for Independent Studies (CIS).